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Taxar Lucros (de novo)

Cada vez mais ávido por dinheiro, governo corre atrás do próprio rabo

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Autor/Imagem:
João Zisman - Foto Editoria de Artes/IA

O Congresso aprovou a tributação sobre lucros e dividendos, aguardando apenas a sanção presidencial. Em tese, o movimento tem lógica: ampliar a isenção do Imposto de Renda para quem ganha até cinco mil reais e compensar isso cobrando mais de quem recebe lucros elevados. No papel, é um ajuste que a maioria dos países já adotou. No Brasil, chega com décadas de atraso.

Mas apoiar qualquer ampliação de tributação num país que não entrega o básico sempre soa como aquela velha cena do cachorro correndo atrás do próprio rabo. O Estado arrecada mais, promete mais, gasta mais e, no fim, volta exatamente ao ponto de partida. Sem eficiência, sem impacto visível, sem melhora real. Apenas mais corrida, mais giros, mais cansaço coletivo.

Há argumentos a favor da taxação. Corrige a distorção de dividendos isentos. Reduz assimetrias entre quem vive do salário e quem vive do capital. Moderniza práticas que ficaram paradas no tempo.

Há também argumentos sólidos do outro lado. A empresa paga IRPJ e CSLL sobre o lucro. Depois paga na distribuição. Esse efeito de bitributação estrangula setores, trava investimentos e amplia o custo Brasil. Falar em competitividade num ambiente assim é quase um exercício de ficção. Capital não espera eficiência futura. Capital foge.

E houve ainda o espetáculo silencioso dos parlamentares que se apresentam como liberais e, de repente, mudaram de rota. Não por conversão doutrinária. Por cálculo político. Era difícil defender dividendos isentos enquanto milhões comemoravam o alívio na tabela do IR. Quando o custo eleitoral aumenta, a convicção diminui. Nesse jogo, o voto acompanha a maré, não o manual de princípios.

O governo acerta ao buscar justiça fiscal. Erra ao acreditar que arrecadar mais resolve problemas que dependem de gestão, planejamento, prioridades e coragem administrativa. Sem eficiência, qualquer aumento de imposto vira combustível para o mesmo ciclo vicioso. De novo a imagem do cachorro: correndo, girando, cansando, mas sem sair do lugar.

O país precisa discutir tributação com honestidade. Precisa discutir gasto com a mesma intensidade. E precisa, sobretudo, parar de achar que aumentar receita compensa falta de entrega. Não compensa. Só prolonga o giro.

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Nota de rodapé
O PL 1087/2025 foi aprovado na Câmara e no Senado sem alterações, o que dispensa retorno à Câmara. O apoio expressivo, inclusive de parlamentares liberais, foi impulsionado pelo forte apelo popular da nova faixa de isenção do IR. O texto aguarda apenas a sanção presidencial. A implementação está prevista para 2026, após regulamentação da Receita Federal.

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