ÓCIO
TRABALHO MATA, MEU!
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Chega!
Exploda o relógio! Tire a areia da ampulheta.
O trabalho é uma abstração.
Irmão enjeitado do tempo, nasceu da cabeça fundida de um destes caras estafados de tanto não ter nada para fazer e resolveu mudar o mundo. Criou o trabalho. Invenção que virou convenção. Coisa de “vagabundo insatisfeito e xiliquento”.
“Táoquei” , como diria o outro desocupado, o presidiário-capitão e ex-tudo.
Vamos “cronificar” aqui no espaço do Café Literário uma Ode ao Ócio:
1º. Quando foi a última vez que você se viu sem absolutamente nada para fazer e contemplou o ócio? Momentos como esse são raros, mas estão tomando conta de nosso cotidiano.
2º. O motivo é que mesmo naqueles minutos de espera do ônibus, na fila do banco (se você ainda for ao banco, pois não sabe usar o app digital, o Pix) ou esperando um amigo no bar, a gente não pára de “trabalhar” martelando os dedões no celular. Muito em breve esse tipo de reflexão sequer existirá.
3º. A última geração que viveu o mundo completamente analógico – e portanto pode comparar a espera off-line e a on-line -, não terá mais representantes em cerca de 30 ou 40 anos. Acredite. É inevitável. Geração do “nem nem”, nem trabalha, nem coça o saco, nem ata, nem desata; e as experiências pessoais sobre como a vida era antes do digital e da Inteligência Artificial desaparecerão com ela.
4º. Essas reflexões são provocações do jornalista canadense Michael Harris autor do livro “O Fim da Ausência”. E veja bem, o livro é de 2014. Harris fala sobre a última geração “bilingue” — capaz de traduzir o mundo analógico para o digital, e vice-versa — e como ela será lembrada na História como a primeira geração de “vagabundos absolutamente virtuais”. Você tem dúvidas, né?
5º. Não, meu amigo, minha amiga… Não adiantará acordar mais cedo para acender velas ao deus-trabalho. Definitivamente, ELE também estará dormindo o sono dos justos em cima de alguma nuvem por aí. Entenda: o Trabalho – enquanto praticamos por aqui -, não dignifica o homem.
6º. Como bem pesquisou e defendeu o pensador italiano Domenico De Mais, entramos de cabeça e alma na Sociedade do Ócio. E não adianta espernear. Abre a latinha de cerva estupidamente gelada, solte o futuro cadáver naquela rede embaixo das palmeiras tropicais e curta, meu! Curta!
7º. Claro, mas não se esqueça de carregar a bateria do smartphone, pois você terá todo o tempo do RESTO DE TUA VIDA para girar telas com dedos reumáticos, trocar fakes adoidado e mergulhar na vertigem definitiva da ilusão virtual. Tudo ao som perfeito da genial Madrinha do Brasil, a titia Rita Lee:
“… nada é melhor do que não fazer nada / só pra deitar e rolar com você…”
Portanto,
8º Relaxe, Aproveite e Goze!
*EM TEMPO: caso tenha ataque de soluços, prisão de ventre, alucinações e ouvir vozes em objetos junto de você: consulte um médico.
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Gilberto Motta é escritor, jornalista e professor/pesquisador aposentado, mas que trabalha ainda feito uma besta. Vive na Guarda do Embaú, pequena vila de pescadores e turistas no litoral de SC.