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Bolo no forno

A colher de pau, a bacia e o doce Cauby Peixoto

Publicado

Autor/Imagem:
Eduardo Martínez - Foto Produção Irene Araújo

Coralina, esposa do Alberto, passava boa parte do dia na cozinha, quase solitária, caso não fosse a companhia da voz do mesmo locutor de rádio, que jogava músicas do tempo do ronca para os ouvintes. Entre tantos artistas, a mulher apreciava Ângela Maria, Aracy de Almeida, Nelson Gonçalves, Francisco Alves. A lista era imensa, mas havia um, cuja voz fazia Coralina desejar adocicar o mundo: Cauby Peixoto.

A mulher tratava logo de cantarolar e, caso alguém entrasse na cozinha, ela fazia questão de sorrir aquele sorriso apaixonado: “Cauby é Cauby, né!?” Em seguida, abria os armários para pegar os ingredientes para preparar aquele bolo fofinho para o lanche da tarde. As crianças adoravam, tanto é que, quando percebiam que a mãe estava daquele jeito, já preparavam o estômago para a iguaria que logo iriam devorar sem qualquer cerimônia.

Duas xícaras de farinha de trigo, duas colheres bem cheias de manteiga, três gemas e três claras batidas em neve. Uma pitada de fermento em pó, uma xícara de leite, além do chocolate em pó. O açúcar não poderia faltar e, generosa, despejava quase duas xícaras. Misturava tudo ao som de “Conceição”, umas das suas favoritas.

Coralina deitava um pano de prato sobre a bacia para que a massa descansasse. Que ficasse ali no canto até que crescesse para que fosse derramada na forma para assar. Júlia e Juliana, ansiosas que estavam, rondavam a saia da mãe.

— Mamãe, já tá na hora?

— Calma. Vão brincar no quintal, que daqui a pouco mamãe chama vocês duas.

Apesar das inúmeras distrações daquele local mágico, os animais, as árvores e nem os esconderijos secretos eram suficientes para acalmar as meninas, que contavam os segundos, que lentamente se transformavam em minutos. Mas eis que, por um milagre do Deus do Tempo, as duas correram assim que Coralina gritou.

— Meninas, podem vir!

Júlia e Juliana, esbaforidas e com os olhos arregalados que nem jabuticaba madura, começaram a disputar quem é que ficaria com o quê: a colher de pau ou a bacia. Não tardou, lá estava cada uma sentada no seu canto se lambuzando com o resto de massa crua. Já no forno, o bolo assava, enquanto a voz do Cauby ecoava pelo ambiente. Coralina, por sua vez, suspirava.

— Ah, Cauby é Cauby!

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