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Futuro sem temores

Aflora forte saudade de um Brasil que não existe mais

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Autor/Imagem:
Wenceslau Araújo - Foto de Arquivo

Na juventude, o catedrático Moacir Góes, um afrodescendente de qualidade e de conhecimentos inquestionáveis e que não se opunha a adjetivações, me apresentou a alguns dos grandes mestres dos princípios filosóficos. Professor Moacir me disse certa feita que “uns são homens; alguns são professores, poucos são mestres. Aos primeiros, escuta-se, aos segundos, respeita-se, aos últimos segue-se. Se hoje enxergo mais longe é porque fui colocado em ombros de gigantes”. Obviamente não lembro a autoria da frase, mas jamais esqueci o alcance da máxima de Albert Einstein, cuja sabedoria desde cedo estabeleceu que, por conta das consoantes, o dicionário é o único lugar onde o sucesso vem antes do trabalho.

Na internet da vida e nas redes sociais da biblioteca do bairro, aproveitei o que pude dos velhos e embolorados livros. Por meio deles, convivi com a fina flor do pensamento como se fôssemos colegas de turma. Uma das primeiras frases que li, ouvi reiteradas vezes e anotei em memória seletiva foi escrita pelo ateniense Sócrates, creditado como um dos fundadores da filosofia ocidental e até hoje figura enigmática. Contemporâneo de Platão e de Aristóteles, ele estabeleceu como característica do período socrático a essência de seu ensinamento como base superior à opinião.

Foi aí que surgiu a expressão “Conhece-te a ti mesmo”. Na sequência, certamente em uma daquelas tardes de ótimo humor, ele reconheceu a própria ignorância na expressão “Só sei que nada sei”. Se transportarmos a locução para os dias de hoje, talvez definíssemos o sábio como aquele que sabe que nada sabe. Lembro que qualquer semelhança com os dias vividos, com elementos da vida real é fruto do acaso. Se preferirem, é mera coincidência. Ou não? Melhor que não seja. Os mestres do pensamento seriam capazes de, mesmo no estado defuntório, lamentar profundamente a comparação com quem realmente sabe que nada sabe.

Sem nenhuma alusão empírica, o termo ombros de gigantes não é metafórico. Como disse o matemático e astrônomo Isaac Newton, gigantes são os mestres nos ombros dos quais eu me elevei. E foram muitos. Com todos aprendi que melhor não confiarmos em magia, em mitos ou em seres que, com medo de tudo, vivem de amedrontar o semelhante. E não importa que sejam os de ontem ou os de hoje. Os verdadeiros sábios afirmam que a catástrofe do presente não impede que o futuro seja encarado sem temores. O hoje não deve ser avaliado como passado em potência, mas sim como momento de escolhas e de ação.

Se temos saudades de um Brasil que não existe mais, que o céu volte a ser apenas dos aviões de carreira. Se a tensão, as ameaças e o risco de um novo período tirânico nos fazem perder o sono, nos afastemos do inferno do cercadinho. Se os ossos do ofício ardem mais do que o suportável, é chegada a hora da reação. Os grandes mestres e a vida me ensinaram que tem jeito para tudo. Precisamos nos convencer de que não existem males eternos. Toda dor chega e um dia passa. Quem acredita em duendes, que continue embalando Mateus. Afinal, cada um com seu cada qual. Do meu lado, embora cristão ferrenho, opto por um provérbio Navajo, cuja máxima estabelece que os pensamentos são como flechas. Uma vez lançadas alcançam seu alvo. Mesmo correndo o risco de ser a próxima vítima, diariamente lanço uma flecha contra os tiranos de plantão.

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