Curta nossa página


Risíveis amores em quatro atos (III)

Ato-3: UM CORAÇÃO NAVEGADOR

Publicado

Autor/Imagem:
J. Emiliano Cruz - Foto Francisco Filipino

Continuando a sua saga de conquistador frustrado e ainda pensando em Yuki, bem como no amargo fora que tomara no lombo, JC decidiu ingressar no terreno pantanoso dos aplicativos de namoro.

Apesar de ainda alimentar rancor contra Marco Antônio por conta da dica desastrosa que esse lhe dera no encontro com a linda oriental, JC decidiu perdoar o amigo e pedir conselhos sobre como operar com segurança no Tínder.

— Você não deve acreditar em fotos até ver um vídeo atual da pessoa, em regra, todas são de quinze ou vinte anos atrás. Se a pessoa se mostrar muito doce, equilibrada, amável e compreensiva, esqueça, ela é justamente o oposto disso na vida real.

— Certo, mais alguma coisa?

— Pesquise, compare, aprofunde, não tenha pressa em marcar um encontro em carne e osso, não confie na sua intuição, ela invariavelmente vai enganá-lo.

Após esse cursinho intensivo sobre o mundo da paquera virtual, RC começou a trocar likes e a montar a sua lista de contatos. Cauteloso, levou a sério toda a orientação que lhe foi passada pelo experiente amigo.

Depois de muito especular e interagir, decidiu-se por investir em Carolina, uma esteticista descendente de portugueses. Ela tinha uma loja de vestuário feminino no Brás.

Após convidá-la para jantar, para sua surpresa, a pretendida lhe deu o endereço da loja/residência e pediu para ele encontrá-la lá.

— Olá, sou o Júlio César.

— Muito prazer, JC. Entre, por favor.

Surpreso pela confiança depositada nele, JC aceitou o gentil convite.

— Linda loja, meus parabéns, falou JC.

— Obrigada, dá para o gasto!

Após Carolina servir café, os dois aprofundaram informações sobre a vida presente e passada de casa um.

— Então, como eu já tinha te falado, eu tenho quatro filhos, um mora na Austrália, um em Portugal e outro nos Estados Unidos, a filha mora em Alphaville.

— Impressionante, admirou-se JC. Eu tenho duas filhas que moram em São Paulo. E parabéns também pela sua bio, você parece muito mais jovem do que as cinquenta e duas primaveras que já viveu.

— Obrigada! Eu já fiz algumas lipos e harmonizações faciais. Aliás, você também deveria fazer…

— Você acha?

— Harmonização facial, não lipo. Você está em ótima forma!

— Ah, obrigado, quem sabe… nunca tinha pensado nisso.

— Pois deveria, isso valorizaria a sua boa forma e devolveria a sua jovialidade por inteiro. Bem, vamos jantar, então?

Durante o jantar, Carolina contou toda a sua saga pessoal. Já havia casado três vezes e tinha filhos de três pais diferentes, nascidos em três continentes.

— Além do Brasil, já morei na Austrália e nos Estados Unidos, mas a minha paixão mesmo é Portugal, um dia quero voltar a morar lá.

Após dois meses de namoro, JC já tinha uma boa configuração da pessoa Carolina, e, apesar de alguns senões, achava que ela poderia ser uma ótima companheira de vida para ele: culta, comunicativa, sincera, atraente, vivida, experiente, madura e empreendedora.

Todavia, três “senões” ainda o preocupavam no jeito da pretendida enxergar o mundo: era um tanto alienada e vacilante sobre a realidade política brasileira, com exceção da estética de roupas, não tinha gosto pela arte e, seguidamente, insistia que queria voltar a morar em Portugal, deixando claro a sua falta de nacionalismo brasuca.

— Bem, ninguém é prefeito… e nem quase perfeito, relevou.

— Então, JC, o que você acha da ideia? Portugal é um paraíso perto desse nosso país decadente e sem futuro.

— Não sei, Carol. O Brasil não é tão ruim assim… sempre morei e gosto daqui. E Portugal, pelo que eu sei, não está tratando bem os estrangeiros residentes por lá nesse momento.

— Bobagem, quem tem talento e é produtivo sempre terá lugar por lá.

— Vamos conversar mais sobre isso.

Em uma sexta-feira, JC ficou fortemente gripado e avisou Carolina que ficaria abraçado somente na sua própria cama naquele fim de semana.

—Tá certo, querido, cuide-se e fique de molho. A minha amiga Matilde, aquela que adora a balada que frequentamos sempre, me ligou e perguntou se eu poderia acompanhá-la no sábado.

— Certo, boa discoteca para vocês, divirtam-se!

Recolhido a sua convalescência, JC começou a pensar seriamente na proposta de, a médio prazo, aceitar a ideia da namorada dos dois migrarem para Portugal. Afinal, suas duas filhas já eram casadas e, objetivamente, nada o prendia no país, além do seu nacionalismo.

No domingo, mandou mensagem para Carolina e, estranhamente, a namorada sequer visualizou a missiva virtual. Ele não quis insistir.

Carolina só respondeu a mensagem na segunda-feira.

— Olá, JC. Desculpe não ter respondido antes, está tudo bem, eu estive ocupada.

— Que bom! E então, já estou melhor. Quando a gente pode se ver?

— Olha, tenho que te contar uma coisa… a Matilde se sentiu mal e teve que ir para casa mais cedo no sábado.

— Sério? Nossa, que pena…então vocês não puderam curtir muito a pista de dança.

— Bem, na verdade, ela foi embora e eu fiquei.

— Hum…sei! E aí, conseguiu se divertir?

— Sim, muito! Inclusive conheci uma pessoa..

— Quem?

— Um português, está em férias no Brasil.

— Sei…

— Bem, resumindo a história, a gente se deu muito bem e ele me convidou para ir com ele para Portugal.

— O quê?

— Eu aceitei, vamos casar assim que chegarmos lá. Viajaremos daqui a três dias.

JC ainda encontrou forças para escrever:

— Foi bonita a festa, pá, fiquei contente, ainda guardo renitente, um velho cravo para mim…

…………………………………………

O quarto e último ato deste folhetim será publicado no domingo, 12.

Publicidade
Publicidade

Copyright ® 1999-2025 Notibras. Nosso conteúdo jornalístico é complementado pelos serviços da Agência Brasil, Agência Brasília, Agência Distrital, Agência UnB, assessorias de imprensa e colaboradores independentes.