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Voz de artistas

‘Brasília mudou. Está virando uma velha feia e carrancuda’

Publicado

Autor/Imagem:
Pedro Nascimento

Ganhar de presente um caderno de sua mãe na infância foi o suficiente para Noélia Ribeiro escrever seus primeiros poemas. Começava assim – digamos eterna -, uma paixão escrita em versos e prosa.

Pernambucana do Recife, onde nasceu ao som do Galo da Madrugada, Noélia passou a infância no Rio 40º. Já menina-moça mudou-se para Brasília, onde ganhou da geração mimeógrafo o título de musa.

Virou a musa do cerrado. Brasilia pulsava. Em entrevista a Notibras, Noélia diz acreditar que Brasília perdeu sua jovialidade.

“A cidade envelheceu junto com a gente; e como toda velhinha, tem hora que quer se divertir, e deixa todo mundo se divertir, e tem hora que quer dormir e não deixa ninguém se divertir. Mas ainda pulsa o lado inspirador da cidade. Porém, embora existam muitos artistas para fazer as coisas, espaço já não há mais”, lamenta.

Lei do cale-se – A Lei Distrital nº 4.092, de 30 de janeiro de 2008, que regulamenta o controle da poluição sonora e os limites máximos de intensidade da emissão de sons e ruídos, se tornou um cabo de guerra entre lazer e descanso.

Esse dispositivo, mesmo que legal, tem censurado bocas com sua Lei do Silêncio, calando bares e vozes que antes cantavam livremente.

Diante desse quadro, empresários e artistas têm se manifestado a favor de alterações na legislação.

“Os vizinhos e a Agefis (Agência de Fiscalização que se mete em tudo o que acontece na capital da República), ficam medindo os decibéis, e isso é muito cruel para Brasília. Assim, a idade fica enjoada e carrancuda”, cutuca Noélia.

Com a boca fechada pela Agefis, conta Noélia, as pessoas estão indo para o Eixão, onde cantam fazendo da grama seu palco, seu auditório. Mas isso “até a hora que alguém disser que não pode mais, que é proibido”, desaba Noélia, arrematando: “Tá chato. A gente agora tem que ficar buscando espaço que antigamente já era nosso”.

Renato Russo – Nos tempos de liberdade – e mesmo com resquícios de um regime ditatorial -, quando a juventude ocupava a cidade, Noélia conheceu Renato Russo. Foi via o maior ídolo do rock brasileiro, morto há duas décadas, que ela conheceu os The Smiths.

Eles sempre estavam nas ruas e nas ruas se encontravam. “Eu já fiquei no Conic conversando com o Renato por horas. Ele era uma pessoa que gostava de muitas coisas. Um buscador, não ficava restrito a nada”, recorda a fá de Renato Russo.

Ela lembra que quando ele a via, ajoelhava-se e beijava sua mão. Segundo Noélia, era o jeito de Renato mostrar carinho com as pessoas que se aproximaram dele antes da fama. “Foram tempos que marcaram toda uma vida. Tempos de saudades”, diz.

Tímida, Noélia evitava recitar seus poemas em saraus, até que incentivada pelo falecido poeta Paulo Tovar, começou a se mostrar para o público. Noélia também virou personagem de poema no lápis de Nicolas Behr, seu grande amigo e namorado na época.

Nicolas escreveu “Nossa Senhora do Cerrado”, que virou Travessia do Eixão, cantada e gravada por Liga Tripa e pela Legião Urbana.

Espivetada – A mãe de Nino e Alice decidiu deixar a poesia de lado e fazer outras coisas. Mas, tão logo sentiu uma necessidade de voltar aos velhos tempos, não hesitou. E sua obra está aí, falando de relacionamentos, encontros, desencontros e da angústia de viver numa cidade que dorme cedo e acorda tarde.

Hoje Noélia recita seus poemas em saraus para onde é convidada. Distribui seus livros em eventos, e tem uma alma adolescente e incansável, a mesma dos anos 80.

Amanhã ela volta a escrever, mesmo se for um domingo. Uma mão segura a caneta e a outra a solidão. Aquela solidão que todo poeta ou poetisa carrega no momento de sua escrita.

Noélia lançou há pouco o terceiro livro de poesias de sua trilogia. É o “Espevitada”.
Pode ser adquirido através do e-mail nmariarsilva@hotmail.com.

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