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Lambança geral

Calor infernal é provocado pelo homem na guerra com natureza

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Mathuzalém Júnior - Foto Fernando Frazão/ABr

Estamos a dois passos do inferno climático. Talvez menos de dois. Provavelmente, a um único passo. De acordo com o observatório europeu Copernicus, 2023 deve ser o ano mais quente em 125 mil anos. Conforme a instituição de nome pra lá de sugestivo, o mês de outubro quebrou uma série de recordes. Por exemplo, foi o mais quente já registrado em nível mundial, com uma temperatura média do ar à superfície de 15,30º.C, 0,85º.C acima da média do mesmo mês de 1991 e 0,40º.C acima do outubro mais quente anterior, ocorrido em 2019. Tudo isso por conta do aquecimento global, acentuado pela emissão de gases de efeito estufa (GEE).

Sacrificados pelos interesses de meia dúzia de pessoas, estamos perdendo a corrida para as mudanças climáticas. Independentemente do El Niño, da patroa El Niña, do Tião, da Tiana, do Zé e da Zefa, a tendência para os próximos anos é de recolhimento ao freezer. Dados da Organização Meteorológica Mundial (OMM) revelam que pela primeira vez a temperatura global deve se elevar em 1,5º.C nos próximos cinco anos. No Brasil, o impacto das mudanças climáticas será ainda mais sentido no Nordeste, onde as áreas semiáridas e áridas deverão sofrer uma redução dos recursos hídricos. E o que tem gerado tudo isso? Nós, os seres humanos ditos inteligentes, somos os grandes culpados de nossas próprias mazelas.

Responsável por cerca de 60% do efeito estufa, cuja permanência na atmosfera é de pelo menos centenas de anos, o dióxido de carbono (CO2) é proveniente da queima de combustíveis fósseis (carvão mineral, petróleo, gás natural, turfa), queimadas e desmatamentos, os quais destroem reservatórios naturais e sumidouros. Também colaboram com a catástrofe climática os gases metano (CH4) e o óxido nitroso (N2O). Na prática, o resultado da lambança humana é a indisponibilidade de água em mais regiões do país, o agravamento dos períodos de seca em áreas onde a falta de água já é comum e o risco maior de secas agrícolas, que afeta plantações, e de secas ecológicas, que aumentam a vulnerabilidade dos ecossistemas.

Entre as principais consequências do efeito estufa destacam-se o derretimento das calotas polares e o aumento do nível do mar. A decorrência é óbvia: inundações, secas intensas, incêndios severos, tempestades catastróficas, escassez de água, extinção de espécies e danos irreparáveis a diversos ecossistemas. Enquanto nós e nossas autoridades nada fizermos, a temperatura do planeta aumentará a cada ano. O El Niño, a El Niña e congêneres estão loucos para nos enterrar no buraco de ozônio. Para evitar o inferno, poderíamos desligar aparelhos e lâmpadas que não são usados, preferir o uso de fontes de energia limpa e renováveis, como a solar e a eólica (dos ventos), a biomassa e deixar mais o carro em casa, contribuindo para a redução do consumo de combustíveis fósseis e seus derivados, como a gasolina.

Poderíamos, mas nem estímulo para isso recebemos. Em Brasília, capital do país, convivemos com a péssima oferta de transporte público. Aliás, desde que inventaram a história de que o brasiliense médio é dividido em cabeça, tronco e carro, nenhum governante mediano conseguiu dar jeito na máfia dos ônibus. Os ruins nem tentaram ou tentam. Na Amazônia, depois daquele presidente metido a conservador de direita, mas claramente preocupado com o próprio umbigo e, quando sobrava espaço, com a família, tudo mudou. O nem lá e nem cá liberou geral as queimadas. No seu tempo, a floresta só não foi dizimada porque ele perdeu a eleição, o rebolado e os direitos políticos por oito anos. Tomara que vire cinzas, como parte da região amazônica, para a qual “cagou” geral.

Reuniões, debates e cartas de intenção não solucionam o problema que é de todos, mas nem todos querem resolver. Grandes vilãs do aquecimento global, as nações mais industrializadas não querem saber de solução. Incentivar a agricultura sustentável e a diminuição do uso de agrotóxicos, restaurar e reflorestar 18 milhões de hectares até 2030, recuperar 30 milhões de hectares de pastagens degradadas e incentivar a ampliação da malha ferroviária seriam algumas das ideias que o cidadão comum poderia apresentar ao governo do Brasil, celeiro hídrico e agrícola do mundo. Quanto a nós, os mais afetados com as mudanças que produzimos no clima, a ordem divina é para que coloquemos as barbas e as demais partes de molho. Com a inércia do Poder Público, façamos nossa parte reusando materiais, economizando água e energia elétrica, usando, quando possível, o transporte público. Ou mudamos ou não conseguiremos fugir das consequências do clima.

*Mathuzalém Júnior é jornalista profissional desde 1978

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