Câmara Legislativa rebaixada de ‘Casa do Espanto’ para ‘Casa de Almas Sebosas’

Alma sebosa é uma expressão originalmente criada no âmbito policial para se referir a marginais, mas adquiriu o sentido de pessoa desprezível, nociva à sociedade.

A Câmara Legislativa do Distrito Federal (CLDF), inaugurada em 1991, outrora já foi chamada de Casa do Espanto em função de projetos descabidos ali apresentados e aprovados e do custo econômico da instituição. E isso num tempo em que havia um pouco mais de civilidade e racionalidade no ambiente político, em que o convívio era mais saudável e as proposições eram menos fantasiosas e serviam a algum propósito racional mínimo, embora muitas questionáveis. O embate entre contrários era de caráter mais pragmático, buscava-se algo concreto para a sociedade.

Atualmente, desde a ascensão do delírio coletivo de extrema direita no Brasil, que fez emergir dos esgotos o que de pior pode existir na alma humana, materializado na figura escatológica de Jair Bolsonaro, e que engolfou Brasília de uma forma estarrecedora, o epíteto Casa do Espanto já não serve nem para xingar aquela casa legislativa, ele tornou-se inofensivo diante dos horrores que aquele coletivo, com raras e honrosas exceções, tem propiciado ao Distrito Federal.

Recentemente foi aprovada uma lei que supera o absurdo, o que só é compreendido como sendo realidade em face de ter saído desta atual CLDF. Parlamentares absolutamente desconectados da realidade de Brasília e do país, que via de regra negligenciam as reais necessidades da sociedade, aprovaram um projeto que permite a instalação de câmaras de vigilância dentro das salas de aulas das escolas do Distrito Federal. Nas alegações para o projeto, sequer tiveram algum temor ao exibir o intuito de tal medida: coibir o comportamento ideológico dos professores e combater o que chamam de ideologia de gênero e marxismo ideológico criando uma alegoria inexplicável de escola sem partido, o que quer que isso venha a significar, visto ser muito questionável a capacidade cognitiva de quem propões e aprova este tipo de medida.

Há atualmente na sociedade movimentos, movidos por um sentimento paranóico de perseguição conspiratória atribuída a um suposto marxismo cultural, que defendem medidas que à luz de um exame acurado de saúde mental podem qualificar estas pessoas como portadoras de algum distúrbio mental, alguma forma de esquizofrenia.

Com vistas a uma suposta proteção de uma família sadia, o que quer que isto venha a ser no imaginário doentio de quem propugna este tipo de coisa, e de uma sociedade livre de qualquer tentação ou “desvio”, diversas pessoas sem o mínimo de capacidade política e de compreensão de mundo são eleitas, com uma suposta missão divina de proteger esta sociedade, o que revela um traço religioso baseado numa leitura enviesada da bíblia, mesmo sendo a bíblia a expressão de apenas um setor religioso, mas que no imaginário destas pessoas é o único que pode existir, revelando aí outro traço característico deste tipo de gente, o autoritarismo. E isto, infelizmente foi o que parece ter prevalecido na atual escolha dos representantes que compõem a CLDF.

O fato é que, caso esta aberração aprovada seja sancionada pelo governador do DF, um precedente perigoso se abre contra a liberdade de cátedra, e por conseguinte de expressão. Ademais cabe lembrar que se trata da captura de imagens pessoais não autorizadas e, o pior, de crianças e adolescentes em flagrante atentado contra o Estatuto da Criança e do Adolescente.

São exemplos deste tipo que colocam boa parte dos componentes da Câmara Legislativa dentro deste conceito de almas sebosas, aquelas que atuam contra uma sociedade sadia, pessoas perversas que se dedicam a criar meios de dificultar a vida sã das pessoas e dão as costas para as aspirações legítimas do tecido social, quais sejam uma vida tranquila com boas condições de saúde, segurança e direito a um trabalho decente, iniciativas que parecem não constar do escopo de interesse de parlamentares que aprovam tamanha insanidade, como este monitoramento das salas de aula.

Como não fosse esta medida suficiente para estarrecer a sociedade, para elevar o espanto a referida casa legislativa aprovou e o governador sancionou outra pérola de um enlouquecimento proveniente de uma destas mentes doentes: um dia em memória das vítimas do comunismo no DF, medida tão espantosa, esdrúxula e fora da realidade que causou a demissão do Secretário de Relações Institucionais do DF. Infelizmente não se pode esperar algo positivo que saia daquela casa, outrora do espanto e atualmente de diversas almas sebosas, onde representantes realmente imbuídos de buscar caminhos e soluções para as questões reais da sociedade são uma imensa minoria. Preparemo-nos para o pior, pois ali viceja o inimaginável. Claro, negativamente.

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Antonio Eustáquio, correspondente de Notitbras na Europa, fica de olho também no que acontece em Brasília