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Ladrão de cavalos

Canela Seca ludibria delegado João do Boné e casal de fazendeiros

Publicado

Autor/Imagem:
Eduardo Martínez - Foto Irene Araújo

Canela Seca tinha pacto com o Jurupari. Se dizia que iria aprontar mais uma, mandava espalhar por toda a região. Queria porque queria que o destemido delegado João do Boné tomasse as devidas providências para impedi-lo. Atrevido que nem macaco-prego, se era para roubar, que fosse debaixo do bigode do homem da lei.

E foi assim que o mais notório e notável ladrão de cavalos do entorno do Distrito Federal acordou naquela manhã. Mal colocou os pés no chão gelado da cabana, o homem se deparou com uma ardilosa jararacuçu já armada para lhe dar o bote. Canela Seca, com a velocidade de um gato do mato, agarrou a cabeça da serpente, antes que a danada pudesse cravar as presas nele.

Não foi preciso gastar muito tempo para pensar no que faria com a cobra. Canela Seca não desejou mal à venenosa. Tanto é que, assim que calçou as botinas gastas e bebericou o último gole de café, caminhou pouco mais de 200 metros e deixou a jararacuçu rastejar para uma moita logo ali perto do riacho Monjolo. No entanto, antes de dar meia-volta, lançou um desafio à peçonhenta: “Te espero amanhã de manhã no mesmo local.”

O homem se agachou às margens, pegou um pouco d’água e lavou o rosto. Sorriu o sorriso dos facínoras e tomou a trilha adiante, que, sabia, o levaria para a fazenda do poderoso Gaspar Ildo, que, dependendo da velocidade do falante, soava Gasparildo. Não tardou, chegou ao topo da colina bem em frente à enorme propriedade.

Canela Seca observou a manada, que parecia agitada, talvez percebendo o que estava para acontecer. Dona Santina, esposa de Gasparildo, havia começado um dedo de prosa com o marido e o delegado João do Boné, quando Dançarino, o lindo garanhão negro, relinchou. Os três voltaram os olhos para a manada e, então, avistaram Canela Seca já sobre o lombo do cavalo.

João do Boné, mais ligeiro do que o velho jabuti Dorminhoco, que tirava uma soneca debaixo de uma goiabeira, sacou o revólver. Efetuou não sei quantos disparos, mas nenhum estrondo, somente estalidos quase inaudíveis. O policial, por descuido ou falta de hábito, não havia colocado balas no tambor.

– Anda, homem, que o Canela Seca tá fugindo! – gritou a mulher.

O policial, apesar da falta de coragem, preferiu enfrentar o larápio a ter que medir forças com a esposa de Gasparildo. Correu como pode e montou no cavalo mais próximo. Não adiantou, pois o mais famoso bandido da região, em cima do Dançarino, fugiu do local puxando outro cavalo. O prejuízo, naquele dia, havia sido em dobro para Gasparildo e a esposa.

– Diacho, esse ladrão parece ter asas nos pés! – João do Boné, cabeça baixa, murmurou.

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