Apêndice da vida
Cinco horas sem celular é um jejum tecnológico forçado
Publicado
em
Ontem vivi uma experiência quase mística: fiquei cinco horas sem celular. Não foi por escolha, não foi uma tentativa de detox digital. Foi acidente mesmo. Uma daquelas quedas em câmera lenta que a gente vê acontecer, mas não consegue evitar, só observa, grita um “nãããão” abafado e aceita o destino cruel do aparelho rachado e inútil.
Levei o bichinho pra consertar com o coração apertado, como quem leva um parente querido pra uma cirurgia. E depois disso fiquei só eu e o mundo real. O que fazer agora? Ler um livro? Observar as nuvens? Conversar com outros seres humanos presencialmente?
Nos primeiros minutos, senti uma espécie de coceira fantasma. A mão ia sozinha pro bolso, como se meu cérebro recusasse aceitar que ele não estava lá. Parecia uma viúva inconformada com a partida do seu amor.
Sem celular, percebi o quanto estou (estamos todos) completamente dependentes dessa telinha luminosa. Não é só vício em rede social, embora eu confesse que senti falta de dar aquela espiada no Twitter. É dependência real e funcional: como faz pra pagar o almoço sem Pix? E o e-mail do trabalho que eu precisava responder? E a senha do banco que só tá no aplicativo, que só abre com a digital, que só existe no aparelho que estava… desmontado numa assistência técnica?
Descobri, entre uma tentativa frustrada de ligar pra alguém usando o telefone fixo (sim, ele ainda existe) e uma visita ao caixa eletrônico, que a gente virou uma geração que sabe tudo, menos viver offline. Nossa memória agora mora na nuvem. Nosso dinheiro também. Nossa vida inteira está dentro de um retângulo que cabe no bolso e quebra com uma facilidade assustadora.
Depois de cinco horas recebi de volta meu celular, funcionando, reluzente, como se nada tivesse acontecido. E aí… respirei aliviada. De volta ao mundo virtual. Mas com uma pulga atrás da orelha e uma reflexão na bagagem: talvez a gente precise, de vez em quando, quebrar o celular (não literalmente, por favor!) só pra lembrar que o mundo gira mesmo quando a gente não tá atualizando o status.