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O arroz...

Como desvendar o conflito de identidade sobre ser piauiense ou maranhense?

Publicado

Autor/Imagem:
Eduardo Martínez - Foto Acervo Pessoal

Sou apaixonado por uma piauiense. Quer dizer, ela nasceu no Piauí, mais precisamente em Teresina, mas jamais morou na sua terra natal. Foi aquele bate e volta da minha sogra, então grávida da minha amada, no hospital e nada mais.

Dona Irene, a minha mulher, cresceu no estado ao lado, no caso, o Maranhão, no município de Caxias. Por conta dessa peculiaridade, ela parece carregar um conflito de identidade. É que, não raro, ela enche o peito e fala que é do Piauí, porém, já no minuto seguinte, jura que é maranhense.

Acho graça, mas não digo nada, só observo. Já estou calejado para colocar lenha na fogueira, pois já sei onde isso vai parar. Certa vez, no tempo de namoro, a paixão futebolística dela começou a me encher a paciência. Não sou o mais apaixonado por futebol, que considero um esporte, muitas vezes, chato e, não raro, com o juiz apitando deliberadamente para um dos lados, inclusive tendo como cúmplices bandeirinhas e comentaristas.

Ademais, nunca fui entusiasta de nenhum esporte, apesar de, esporadicamente, assistir a uma ou outra modalidade. A Dona Irene, a torcedora mais fanática do Palmeiras, às vezes, cancelava uma ida ao cinema ou, então, a um churrasco com amigos, simplesmente porque, naquele horário, irá passar um jogo do seu time do coração.

— Amorzinho, mas você nem é paulista.

— E daí?

— Ué, eu nasci em Botafogo, morei em Botafogo e, naturalmente, sou Botafogo.

— Hum! Edu, você nem gosta de futebol. E tem mais!

— O quê?

— Você prefere Copacabana!

É verdade a conclusão da minha esposa, pois sempre fui apaixonado pelo bairro ao lado. Mas voltemos a essa incongruência piauiense/maranhense, já que o mote desta crônica é a Dona Irene, cujo sorriso me encantou desde o primeiro instante.

Gosto de cozinhar e, de vez em quando, me sinto a saudosa Ofélia, famosa pelo pioneirismo como apresentadora/cozinheira na televisão brasileira. Havia preparado uma lasanha à bolonhesa. Abri um vinho para a paixão da minha vida, enquanto fiquei no suco de uva. Não sei se você sabe, mas não bebo, nunca gostei do gosto de álcool. Seja como for, tudo perfeito. Quer dizer, eu achava que sim.

Para minha surpresa, quando já estávamos à mesa, pratos já preenchidos com generosas porções de lasanha, taças com as devidas bebidas, a Dona Irene começou a torcer os lábios, como se alguma coisa estivesse faltando.

— Ué, não vai comer?

— Edu, tô esperando o arroz.

— O quê?

— O arroz!

— Mas vamos comer lasanha.

— E daí?

— Daí que não se come lasanha com arroz. Aliás, não se come lasanha com nada.

— Edu, aprenda uma coisa.

— O quê?

— Maranhense jamais come sem arroz.

……………………….

Eduardo Martínez é autor do livro 57 Contos e Crônicas por um Autor Muito Velho’

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