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Lembrando João e Maria

Crianças devem evoluir com os próprios passos

Publicado

Autor/Imagem:
Hellen Reis Mourão

João e Maria é um conto de fadas que foi coletado da tradição oral e transcrito pelos irmãos Grimm. E é um conto bastante popular, principalmente entre as crianças.

Todos nós carregamos uma imagem interna do que é a mãe, e nós nos confrontamos com essa imagem a todo o momento em nossas vidas. E essa imagem carrega em si o lado bom, protetor, afetuoso, que nos enche de carinho e prazer e o outro lado sombrio que é o da fome, do sofrimento e até da morte.

E esse lado sombrio é retratado nos contos de fadas, como uma madrasta, uma bruxa, uma feiticeira. Mas a verdade é que podemos encontrar os dois lados juntos em uma mesma pessoa. E o conto João e Maria trata do processo de encarar o lado terrível da mãe.

Enquanto bebês, nossas mães nos alimenta e nos carrega no colo, mas quando crescemos deixamos de ser ninados e temos que passar a ser independentes. E isso traz uma sensação de abandono, que faz com que olhemos para nossas mães como bruxas.

Infelizmente aquela mãe protetora, que coloca no colo deve desaparecer para que a criança encontre seu próprio valor e se desenvolva como personalidade própria no mundo, senão ela será um brinquedinho e uma extensão da mãe.

O fato da família no conto passar fome significa que a mãe não pode mais dar o alimento, que é o colinho. A comida é apenas um símbolo de que o individuo sente fome de novas vivências. João e Maria estão crescendo e precisam ter novas experiências e contato com o mundo. Isso pode ocorrer com a ida à escola, onde a criança pode se sentir abandonada pela mãe e a vê-la como fria e cruel.

Quando a ingenuidade e o lado infantil vão embora, para que o lado adulto, e astuto, tome conta

Outro ponto importante a ser analisado é o fato de termos um casal de crianças como protagonista. Maria é a típica menininha que chora e João é aquele que tenta resolver os problemas. Na verdade, sem entrar no mérito da questão dos gêneros, esses dois lados estão presentes em nós. Independente do nosso sexo, por vezes, em uma situação difícil, podemos sentir vontade de chorar, mas ao mesmo tempo podemos sentir algo pulsando em nós querendo resolver a situação.

A floresta, em geral, é um símbolo do inconsciente, aqui no conto podemos afirmar que quando a criança vai para o mundo, automaticamente ela passa a separar o que é mundo interno e externo. A consciência separa os opostos, antes ela vivia em um estado de plenitude, mas agora enfrenta as demandas do mundo externo e do seu mundo interno inconsciente.

Nesse instante, eles encontram a casa de doces e a bruxa. A bruxa se mostra bondosa e generosa, mas sua intenção é devorar as crianças. Agora que a criança não está mais sob os braços da mãe, ela terá de lidar com a figura interna da mãe terrível, uma figura arquetípica presente no inconsciente coletivo. Ela é cega, portanto ela não quer ver que as crianças estão crescendo, ela quer “comê-los”, devorá-los simbolicamente, para que voltem ao seu ventre e não cresçam. É um aspecto regressivo nosso que anseia voltar para a barriga da mamãe.

Mas observem que ela quer comer o menino e a menina lhe serve como escrava. Ou seja, seu animus deve continuar fraco e infantil, entretanto ao passo que ela deseja destruí-lo ela acaba fortalecendo mais seu lado masculino. Ao lhe dar mais comida, ele adquire mais força.

Mas é a menina que engana a bruxa e a faz cair dentro do forno. Ou seja, a menina que vivia chorando agora adquiriu objetividade e astúcia. A ingenuidade foi embora, o lado infantil que se apavora agora confia em seus instintos (isso fica claro quando Maria adquire uma sensatez em relação ao cisne, seu lado animal, fazendo com que ele leve um de cada vez ao outro lado da margem do lago).

As crianças finalmente voltam para casa, agora trazendo as riquezas encontradas em seu inconsciente e compreendendo que foi necessário cortar o cordão umbilical para que pudessem amadurecer.

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