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Patrimônio mal explicado

Dinheiro na mão é tentação, mas para os Bolsonaro, vale é imóvel

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Autor/Imagem:
Marina Amaral, Diretora Executiva/Agência Pública Jornalismo Investigativo - Foto de Arquivo

Uma reportagem primorosa escancarou a corrupção de Jair Bolsonaro e sua família dois dias depois do fraco debate entre os presidenciáveis. Ao cabo de sete meses de investigação, os jornalistas Juliana Dal Piva e Thiago Herdy revelaram no UOL que quase metade do patrimônio milionário da família Bolsonaro foi pago em dinheiro vivo.

O que não é crime mas, como disse o especialista em transparência pública Fabiano Angélico, é “extremamente suspeito, ainda mais se a gente lembrar que existem evidências e testemunhos pretéritos a respeito de um possível ou provável esquema da chamada rachadinha nos gabinetes, que gera dinheiro. Quando você olha uma ponta da história e olha outra, e tratando-se de quem se trata, tudo isso é um conjunto de indícios muito forte”, afirmou, em entrevista ao UOL.

Também chama a atenção o volume dos investimentos da família. Foram 107 imóveis negociados nos últimos 30 anos e “51 imóveis foram adquiridos total ou parcialmente em dinheiro vivo, segundo depoimentos dos próprios integrantes do clã”, assinala a reportagem. Em moeda sonante, 25,6 milhões de reais circularam em malas de dinheiro nas mãos de Jair Bolsonaro e seus familiares. Além disso, 25 imóveis estão ou já estiveram em investigação pelo Ministério Público do Rio ou do Distrito Federal. Entre eles, a casa em que o presidente mora no condomínio Vivendas da Barra no Rio e a mansão de Flávio Bolsonaro em Brasília.

Duas palavras sobre os endereços: o condomínio na Barra da Tijuca é aquele em que os dois acusados de matar Marielle Franco se encontraram no dia do crime; a mansão de Flávio, avaliada em 5,7 milhões, abrigava um escritório de advocacia com apenas dois clientes, como revelou, em junho, a nossa repórter Alice Maciel.

O impacto da reportagem de Juliana Dal Piva e Thiago Herdy já se fez notar. Ontem, o STF designou um relator (o “terrivelmente evangélico”, infelizmente) para dar prosseguimento à ação protocolada na quarta-feira pelo senador Randolfe Rodrigues, pedindo a investigação da aquisição dos imóveis pelo clã Bolsonaro. “Só enriquece na política e constrói esse patrimônio quem está roubando. Estou convencido que teve ladroagem e roubo de alguma forma”, disse o senador ao UOL News.

Atrás de um discurso ideológico radical, os Bolsonaro escondem uma ganância que sempre esteve ali, desde o tempo em que o jovem Jair garimpava escondido de seus superiores no Exército, o que lhe valeu uma anotação na ficha militar por “excessiva ambição”, como revelou em 2017 o repórter Rubens Valente. Garimpava de forma ilegal, sublinhe-se, já que não era registrado na AMN como contou Valente, que entrevistou Bolsonaro quando ele não passava de um deputado do baixo clero que aspirava à presidência. Ao então repórter da Folha, o deputado Bolsonaro disse: “O garimpo, de vez em quando, eu pratico ainda. Não causo nenhum crime ao meio ambiente. O garimpo é um negócio que está no sangue das pessoas”.

É esse apetite que Bolsonaro busca ocultar quando acusa seus adversários de corrupção enquanto se alia a criminosos na Amazônia ou no Rio de Janeiro. Também é desse credo que compartilha com os pastores que desviam dinheiro do Ministério da Educação e do Ministério da Saúde enquanto dizem ter “Deus no coração” e perseguem mulheres e pessoas LGBTQIA +. É a voracidade pelo dinheiro público que o une aos líderes do Centrão e suas emendas secretas explorando a pobreza dos municípios de sua base eleitoral. A indiferença diante das mortes dos Ianomâmi, das vítimas da Covid, da fome de 33 milhões de brasileiros é a prova da sua empatia com os criminosos.

É tudo por dinheiro. Sempre foi.

PS – Uma palavrinha sobre o debate entre os presidenciáveis do qual já se falou quase tudo. Foi lamentável a atitude da TV Bandeirantes, com a cumplicidade de todas as empresas que compunham o pool do debate, permitir e silenciar sobre as agressões de Bolsonaro à jornalista Vera Magalhães. Em qualquer emissora decente, o microfone do agressor teria sido cortado e o candidato advertido para a necessidade básica de manter o respeito à jornalista mulher que o questionou com base na liberdade de imprensa. Nossa solidariedade a Vera Magalhães e a todas as mulheres agredidas repetidamente pelo presidente da República.

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