O mágico e o repórter
Entrevistado some como coelho em cartola furada
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Aceitou conceder entrevista, mas exigiu conferir antecipadamente as perguntas. Nada de falcatruas por parte do repórter. Do contrário, interromperia ali mesmo. O entrevistador, microfone conectado ao gravador do tamanho de um tijolo, acionou a tecla, e a gravação começou.
— Há quanto tempo está no ofício?
— Costumo falar que antes de nascer. Meus pais, que também eram do ramo, se conheceram quando trabalharam na mesma trupe. Mamãe, para você ver, quase me teve durante a apresentação. Foi por pouco. Logo após os aplausos, nasci nas coxias.
— Deve ter sido tensa tal situação.
— Para quem é do ramo, não muito.
— Mas a sua mãe não era malabarista?
— Sim. E papai era palhaço.
— Hum. Então, por que você se tornou mágico?
— Porque quis.
— Mas por quê?
— Porque, sim.
— Mas não teve um motivo especial?
— Vontade.
— Vontade de ser diferente?
— Vontade de ser mágico.
— Sem motivo?
— Seus pais são repórteres?
— Não.
— Por que você quis ser repórter, então?
— Porque, sim.
— Mas deve ter tido um motivo.
— Desejo.
— Hum. Desejo de ser diferente?
— Peraí! Quem faz as perguntas aqui sou eu.
— Pois é, o jornalista é você.
— E você é o mágico.
— Exato.
— Então, sua vida é fazer truques.
— Mágica.
— Mas mágica não existe.
— Existe.
— Hum… Você por acaso possui poderes?
— Sou mágico.
— Então, você tem poderes?
— Sou mágico.
— Se é mágico, então, prove.
Diante de tamanha indiscrição, o mágico se levantou e nunca mais apareceu. Não se teve qualquer notícia dele. Talvez, tenha entrado em uma cartola. Ninguém sabe ao certo. Escafedeu-se.
*Eduardo Martínez é autor do livro “57 Contos e Crônicas por um Autor muito Velho”.
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