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É punir e punir

Escrúpulos de consciência com golpistas devem ir para as favas

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Mathuzalém Júnior - Foto Marcelo Camargo/ABr

Apesar da pior página de nossa história contemporânea, a triste intentona de 8 de janeiro de 2023 tem de ser lembrada com uma das maiores vitórias do povo brasileiro depois da ditadura de 1964. Há um ano, embora desrespeitada, a Constituição de 1988 fez valer sua força, mais uma vez contribuindo para que o Brasil fosse passado a limpo. A coragem e a firmeza dos integrantes do Supremo Tribunal Federal também foram fundamentais para que a Carta Magna mostrada ao mundo por Ulysses Guimarães embargasse fraturas imensuráveis e de difícil cicatrização no Estado Democrático de Direito. Juntas, as instituições sérias do país, entre elas o Congresso Nacional, impediram que a ruptura institucional mais uma vez fosse materializada.

Reitero a afirmação de que nunca tive, não tenho e jamais terei vinculações partidárias. Meu partido é o Brasil. Portanto, não escrevo para defender ou acusar quem quer que seja. No entanto, como democrata e cristão, é impossível negar que a limpeza começou no primeiro dia de janeiro do ano passado. Lembrar do golpe fracassado é comemorar o fim do desgoverno anterior. Também é propagar a tese do jurista e poeta Carlos Ayres, ministro aposentado do Supremo Tribunal Federal, para quem “fora da democracia só existe uma coisa: barbárie”. Discordar desta afirmação é o mesmo que referendar o golpismo.

Mentalizados, premeditados e orquestrados por um único cidadão, os ataques às sedes dos Três Poderes foram concebidos e financiados por pessoas inescrupulosas, insensíveis e ávidas pelo poder à custa do sacrifício da sociedade. Deliberadamente, o objetivo dos seguidores de um extremismo ultrapassado, desigual, sem conteúdos e com efeitos práticos somente para os seus era incendiar o país. Na cabeça deles, os bombeiros seriam os membros da cúpula das Forças Armadas, que, supostamente insatisfeitos com o vencedor das eleições presidenciais, marchariam com o sombrio, insípido, insosso e inodoro líder da então tirania.

Daí, entendo a oportunidade de repetir, com uma pequena atualização, uma célebre frase do ex-ministro Jarbas Passarinho: “Às favas, senhores patriotas de bosta, neste momento, todos os escrúpulos de consciência a respeito dos golpistas”.

Que todos tenham o fim que merecem. As constantes ameaças e os feitos antidemocráticos resultantes do amadorismo do desgoverno anterior ajudaram o povo a descobrir que o comando de uma nação com mais de 200 milhões de habitantes não é para canhestros, estabanados, desastrados, tampouco para ignorantes. Tivesse prevalecido a insensatez e a burrice golpista, o desfecho da eleição de 2022 não teria sido aceito. Infelizmente, as consequências não seriam diferentes das experimentadas pelo povo entre 1964 e 1985: as mesmas velhas atitudes, os mesmos velhos resultados. Diz a lenda que pau que nasce torto, morre torto e até as cinzas são tortas.

Sem medo de errar, lembro àqueles que sonharam com o levante que molduras boas não salvam quadros ruins. Diria mais: certamente estaríamos hoje vivendo um ano novo, mas sem perspectiva alguma. Talvez sendo obrigados a também pregar desatinos, sob pena de sentir na pele os males da irracionalidade e da ira extrema. A sociedade ordeira deu uma chance para novas ideias. Pode ser que elas não venham. Todavia, abortar o atentado de 8 de janeiro, evitando suas sequelas, não significou apenas consolidar a democracia. Na raiz, impediu o aprofundamento do caos socioeconômico e, principalmente, a definitiva divisão do Brasil.

O fato é que a insurreição tentada de cima para baixo precisava da desordem provocada pelo grupo de vândalos comandados por um desordeiro contumaz. A inconsequente depredação custou caro ao país. Custou muito mais aos seguidores do mantra “Ele é ladrão”. Obviamente que esses serão os responsáveis pela manutenção da polarização política na eleição municipal deste ano e nas que se seguirão.

Esclarecidos ou não, para sorte da maioria o brasileiro aprendeu a discernir o bem do mal. Como o povo sabe o que quer, prevaleceu a máxima de que a impunidade só é segura quando a cumplicidade é geral. O ato desta segunda-feira em repúdio aos golpistas certamente marcará o primeiro ano de uma nova era. Entretanto, a defesa da democracia e a exaltação à Constituição têm de marcar esta e as próximas gerações.

*Mathuzalém Júnior é jornalista profissional desde 1978

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