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Geração das cavernas

Esses nossos ‘aborrecentes’ que criam e nos deixam sem entender nada

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Autor/Imagem:
@donairene13 - Foto Produção Editoria de Artes/IA

Tenho observado um fenômeno intrigante: os adolescentes de hoje estão, deliberadamente, postando fotos com resolução baixa, fora de foco e, pasmem, às vezes até de cabeça pra baixo. Sim, é isso mesmo. Fotos tremidas, granuladas, com a iluminação de uma caverna e o enquadramento digno de um terremoto estão na moda. E o mais surpreendente: fazem isso com orgulho, como se estivessem reinventando a fotografia contemporânea.

Eu fico olhando e pensando: será que o Wi-Fi caiu no momento do clique? Será que o celular escorregou da mão? Mas não. É proposital. É estética. É conceito. É o “feio-cool”, o “caótico-intencional”, o “estilo filmadora de 2004”.

E aí me vem aquele suspiro longo e cansado de quem já sofreu por uma boa imagem. Eu sou millennial. Vim de uma época em que foto ruim não era escolha, era condição de vida. Lembro quando as primeiras câmeras de celular surgiram. Tinha que escolher entre tirar uma foto ou receber uma ligação, porque fazer os dois ao mesmo tempo era sonhar alto demais. E, ainda assim, a gente se empenhava. Fazia pose. Escolhia o melhor ângulo, o melhor fundo, a melhor luz – mesmo sabendo que no final tudo ia sair embaçado e com a testa brilhando.

A evolução foi lenta, minha gente. A primeira vez que tirei uma foto com a câmera frontal e consegui me reconhecer, quase chorei. Quando descobri o milagre do HDR, pensei: “É isso. Chegamos ao auge da civilização.” Passei anos aprendendo a limpar a lente antes de clicar, descobrindo o modo retrato, ajustando o brilho, salvando a imagem em 4K com lágrimas nos olhos.

E agora? Agora a nova geração me aparece com foto granulada e diz que é “aesthetic”. Aesthetic, meu amor, era baixar o Photoshop pirata e passar horas corrigindo uma espinha. Era aplicar o filtro “Valência” do Instagram com fé e esperança. Era acertar a luz da ring light como se fosse um ritual de invocação.

A verdade é que eu me sinto como um sobrevivente de guerra digital. Passei pelo Orkut, pelo Fotolog, pelos 12 filtros do Instagram, pelas selfies com pau de selfie, e agora estou aqui, tentando entender por que alguém posta uma imagem que parece ter sido tirada por uma câmera de segurança em dia de tempestade.

Mas é isso. Cada geração com suas lutas. Eu lutei por pixels. Eles lutam contra eles. Boa sorte, juventude. Só não me peçam pra entender.

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