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O sonho acabou

Fora do script, Bolsonaro perde outra e se rende ao Plim Plim

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Autor/Imagem:
Mathuzalém Júnior* - Foto de Arquivo

Críticas, elogios são questões inerentes a todo e qualquer ser humano, independentemente da sua condição. No primeiro dia da campanha presidencial de 2018, os então bolsonaristas semente – hoje são raiz – alcançaram o primeiro orgasmo – e último – quando ouviram Jair Messias jurar que sua primeira ação como presidente da República seria acabar com a Rede Globo de Televisão, consequentemente com o império de comunicação da família Marinho. A ideia era cassar a concessão da emissora. O segundo ato – este sequer foi levado a sério – tinha por objetivo colocar no chão a Empresa Brasileira de Comunicação (EBC), considerada pela recém-criada seita bolsonarista como um “aparelho” do petismo. Para quem não se lembra, em algum dia de 2019, 2020 e 2021, o já mandatário adiantou que a Globo (Globo Lixo para os do luxo) teria um encontro com ele em 2022. O “encontro com a verdade” ocorreria imediatamente após a reeleição. Como não houve reeleição, o encontro não aconteceu.

Lembro que, entre as reiteradas ameaças de asfixia financeira, Bolsonaro garantia que a Globo só sobreviveria se ele estivesse morto. Prometeu, mas esqueceu de combinar seu fim e o da Vênus Platinada com os russos. Pior é que, antes de “morrer” politicamente, teve de esquecer o tom ameaçador de boa parte do mandato e, com sua famigerada caneta Bic, sem miado e sem chiado, assinar a renovação da concessão da emissora de seus pesadelos mais primitivos. Junto com a reeleição, uma das derradeiras canetadas do mito significou despejar no ralo do Palácio do Planalto o terrorismo psicológico e o restinho da força que ele verdadeiramente jamais teve. A tinta azul marinho da Bic (nenhuma alusão à família) está secando, mas, próximo do penúltimo pingo, fez Roberto Marinho “gargalhar” no túmulo. O último pingo será assinar sua própria dispensa com justa causa: a falta de votos.

Em resumo, contra a vontade armada de todos os patriotas de porta de quartel do Exército, a Globo continuará Globo por mais 15 anos nas praças do Rio de Janeiro, São Paulo, Brasília, Belo Horizonte e Recife. Nos demais estados, a empresa atua com afiliadas. Em outras palavras, as derrotas para Luiz Inácio e para os Marinhos, representados no cerebelo de Bolsonaro por Willian Bonner e Renata Vasconcelos, nunca fizeram parte do script político-pessoal do mito. Vale dizer que não cabem muitos esperneios, pois renovar ou não a concessão pública de uma emissora de TV ou de rádio não depende exclusivamente do presidente da República. Contra ou a favor, a decisão precisa ser chancelada por dois quintos do Congresso Nacional, em votação nominal. É o que assegura o texto constitucional.

Mesmo que haja veto dos congressistas, a empresa pode recorrer a instâncias superiores, entre elas o STF. Enfim, nada tão fácil como foi pregado lá atrás. Tudo indica que, apesar do retumbante fracasso da seleção de Tite, Neymar e do vovô Daniel Alves, a Copa do Mundo ajudou Bolsonaro a mudar de ideia em relação ao poderio da emissora do Plim Plim. Como os canarinhos perderam cedo as asas, limitei minha pesquisa a estréia do Brasil contra a Sérvia. O jogo rendeu para o conglomerado Globo números raros e até exorbitantes de Ibope. Conforme dados do colunista especializadoa Ricardo Feltrin, a Vênus registrou 50 pontos de audiência (com picos de 53) e 76% de “share” (compartilhamentos) na Grande São Paulo, principal e mais importante praça da TV brasileira. Não é nada, não é nada, mas os dados dizem tudo a quem prometeu encerrar as atividades da líder de audiência em 2023. Diria para os bolsonaristas que, literalmente, o sonho acabou. Ainda que sucateada, até a EBC será devolvida ao PT.

O mito perdeu, Lula da Silva voltou, a Globo se renovou e Bonner e Renata se consolidaram. Como desgraça pouca é bobagem, a maior emissora do país acaba de reassegurar a exclusividade sobre a transmissão da Copa Libertadores, o maior torneio de futebol do Continente. Para quem não quiser assistir o Campeonato Brasileiro, a Copa do Brasil, o Jornal Nacional, o JH, o JG, o Fantástico, os telejornais regionais, a Tela Quente, Ana Maria Braga, Encontro, Domingão do Hulk, Caldeirão e as histórias do Porchat, pode recorrer às novelas das 14h, das 15h, das 17h, das 19h e das 21h.

Os radicais de araque – os que assistem a Globo Lixo escondidos – têm o direito de buscar alternativas moderníssimas, entre elas o seriado Chaves, os programas A hora do Faro, Casos de Família e Ratinho, as novelas Carrossel, Carinha de Anjo, A Usurpadora, Canavial de Paixões e Os Dez Mandamentos, além dos cultos evangélicos programados para encher os cofres dos pastores patriotas. Oh Glória! Que Deus mantenha a Globo entre nós! Amém! Para os aficionados por Bolsonaro e Lula, sugiro dois filmes imperdíveis, ambos na Globo: E o Vento Levou e A volta dos que não foram.

*Mathuzalém Júnior é jornalista profissional desde 1978

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