Dona Irene
Futebol deixa marcas, mas amizade prevalece
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Por determinação superior, estou proibido de comentários de qualquer tipo sobre o tetra da Libertadores. No máximo, o tri. Elogios só a madame Leila, a dona do avião. Em respeito àquelas que mandam, não farei mais referência alguma àquele time que não tem Mundial. A nação vai entender, pois foi dela a sugestão para também não citar o verde sintético dos gramados, muito menos a negritude dos políticos em minhas narrativas. A razão é simples: eles (os políticos) já roubaram toda a graça, a cena, o dinheiro do povo e, por pouco, não sumiram com a alegria do sagrado vermelho do sangue que corre em nossas veias.
Não conseguiram e terão de nos engolir novamente em 2026. Tri ou tetra, somos todos libertadores. Com a recomendação médica de esquecer temporariamente a política, fiquei sem chão. O que fazer? A quem ou a que me referir? Perdido entre o Monumental de Lima e o Congresso Nacional, o que me restou? Nada, além de me imaginar em uma fantasiosa e louca viagem ao redor do planeta supostamente comandado por um capitão de fragata. Ainda levitando, a primeira coisa em que pensei foi na escolha dos amigos. Buscando apoio, confiança e afinidades envolvendo a alma e a essência, optei por aqueles de cara lavada e com a serenidade do olhar exposto.
É assim que os poetas e os pensadores definem as amizades completas e multifacetadas. É claro que as outras são adoráveis e merecedoras de carinho e respeito, mas, naturalmente, as vestidas como o manto sagrado combinam a leveza e a diversão com a profundidade da lealdade. Novamente me valendo da poesia, disse ao agora capitão de bravata que dos amigos não quero só o ombro ou o colo, mas também sua maior alegria. Afinal, amigo que não ri junto, não sabe sofrer junto. Graças aos deuses dos estádios, despertei do devaneio antes que o cidadão em questão vestisse a célebre camisa do tetra.
O que mais posso dizer de quem já torceu por tudo, menos pela própria pátria? Juro que não sei. Enquanto esteve no poder, o então capitão de chibata nunca percebeu que, melhor do que apoiadores aventureiros e colaboradores interesseiros, são os companheiros sérios, aqueles que fazem da realidade sua fonte de aprendizagem e lutam diariamente para que a fantasia jamais se transforme em imerecida pretensão. Independentemente de que vistam outras cores e falem de outros amores, os bons amigos sabem quem sou, exatamente como eu sei quem são.
Como eu, eles são “metade bobeira, metade seriedade, metade infância e a outra metade velhice”. Dispenso os chatos e os oportunistas e fecho a porta para os de risos previsíveis e choro sem graça. Será que ninguém teve coragem de dizer ao capitão sem gravata que nem sempre os amigos leais têm divisas ou Mundial? Tentei dizer, mas ele, me imaginando um soldado raso, preferiu tentar me calar com minutas e teses golpistas.
Ao contrário da amiga que faz das letrinhas uma sopa de prazer e de cultura, ele sequer recebeu os de brilho questionador na pupila e de retina com tonalidade inquietante. Como esses falariam o que ele não queria ouvir, o rebaixado a sargento Tainha resistiu à tentação, à facada e preferiu continuar mentindo para si mesmo. Soube que até o espírito do mestre Millôr Fernandes tentou avisá-lo que os amigos podem não saber muitas coisas, mas sabem sempre o que fariam no nosso lugar. Quanto ao tetra, esqueçam. O que passou, passou. Ficou a certeza da amizade sincera e eternizada pelos laços vermelhos, ora enegrecidos, ora esverdeados, mas sempre na mesma caminhada. E PT saudações.
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Wenceslau Araújo é Editor-Chefe de Notibras
