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Esoterismo Cristão

Giordano, Mago das Trevas, a ciência, a magia e o martírio na Inquisição

Publicado

Autor/Imagem:
Hussein Sabra el-Awar - Foto Editoria de Artes/IA

Giordano Bruno (1548–1600) é uma das figuras mais complexas e enigmáticas do Renascimento. Nascido em Nola, no Reino de Nápoles, sob o nome de Filippo Bruno, ingressou ainda jovem na Ordem Dominicana, onde estudou teologia, filosofia e as obras de Aristóteles. Contudo, sua mente inquieta logo ultrapassou os limites da ortodoxia religiosa, levando-o a romper com o dogmatismo da Igreja. Tornou-se filósofo, astrônomo, místico e mago, sendo considerado por muitos estudiosos como um dos principais representantes da magia renascentista — uma síntese entre o hermetismo, o neoplatonismo e a tradição cabalística.

Influenciado pelas ideias de Nicolau de Cusa, Marsilio Ficino e Hermes Trismegisto, Bruno defendia a concepção de um universo infinito, habitado por inúmeros mundos e regido por uma inteligência divina imanente. Essa visão cósmica, oposta à cosmologia aristotélica e à teologia cristã, introduzia o princípio da infinitude e da unidade universal: “Não há centro no universo, porque tudo é centro e circunferência”, afirmava em De l’Infinito, Universo e Mondi (1584). Tal pensamento não apenas revolucionava a filosofia natural, mas também introduzia uma nova leitura da Magia Natural, entendida como o conhecimento das forças ocultas da Natureza e de suas correspondências microcósmicas e macrocósmicas.

Para Bruno, o mago verdadeiro era aquele capaz de compreender e manipular os vínculos sutis que unem todas as coisas no cosmos. Essa concepção está presente em obras como De Magia e Theses De Magia, nas quais o filósofo retoma o princípio hermético “omnia sunt in omnibus” (tudo está em tudo). Diferentemente da bruxaria popular, sua magia tinha caráter filosófico e metafísico, baseada na contemplação e na ação do intelecto sobre o mundo espiritual. Bruno via na imaginação ativa um poder criador, um instrumento capaz de transformar o real através da mente, antecipando conceitos que séculos depois inspirariam correntes esotéricas modernas e até interpretações psicológicas junguianas.

Durante suas viagens pela Europa — Genebra, Paris, Londres, Wittenberg, Praga e Frankfurt —, Giordano Bruno difundiu suas ideias e escreveu intensamente. Entre suas principais obras destacam-se La Cena de le Ceneri (1584), onde defende o sistema copernicano, De la Causa, Principio et Uno (1584), que expõe sua filosofia da unidade cósmica, e De Gli Heroici Furori (1585), tratado místico sobre o amor intelectual e o caminho do conhecimento divino. Nesses textos, o filósofo constrói uma ponte entre a razão e a magia, entre a ciência e o espírito, propondo um modelo de sabedoria total, onde o homem é imagem viva do universo.

Por tais ideias, Bruno foi considerado herético pela Igreja Católica. Sua negação da transubstanciação, sua crença na pluralidade dos mundos e sua defesa da alma universal feriram profundamente os dogmas da fé. Em 1592, foi denunciado à Inquisição em Veneza, preso e posteriormente transferido para Roma. Durante sete anos de julgamento (1593–1600), Bruno manteve-se fiel às suas convicções, recusando-se a abjurar. Em 8 de fevereiro de 1600, o Santo Ofício o declarou culpado de heresia; em 17 de fevereiro, foi queimado vivo na Piazza Campo de’ Fiori, em Roma, tendo os lábios amordaçados para que não pronunciasse suas últimas palavras.

Seu martírio transformou-se em símbolo da liberdade de pensamento e da resistência à tirania dogmática. Giordano Bruno, muitas vezes chamado de “Mago das Trevas” por seus contemporâneos, foi, na verdade, um iluminador das consciências, um precursor da ciência moderna e um mártir da filosofia hermética. Sua “treva” era a da ignorância que ele ousou desafiar com a luz do conhecimento oculto e da razão livre.

Hoje, sua estátua no Campo de’ Fiori — erguida em 1889 — recorda que a chama que o consumiu não foi a do inferno inquisitorial, mas a do fogo da sabedoria, que continua a arder no coração daqueles que buscam compreender o mistério da existência em sua unidade cósmica e divina.

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Hussein Sabra el-Awar
Membro Conselheiro do Colégio dos Magos e Sacerdotisas
@colegiodosmagosesacerdotisas

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