Uma visita
Irmãs em estradas diferentes são coautoras da mesma narrativa
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Recentemente fiz uma viagem com minha irmã. Foram dias agradáveis, daqueles em que a gente se afasta da rotina e parece ter mais tempo para tudo, inclusive para conversar. E nós conversamos muito. Entre risadas, confidências e assuntos sérios, começamos a lembrar de momentos da nossa infância.
Minha irmã é quase cinco anos mais velha que eu. Sempre achei natural que nossas lembranças fossem parecidas, mas com pequenos ajustes aqui e ali. Afinal, vivemos no mesmo lugar, com as mesmas pessoas e, aparentemente, nas mesmas circunstâncias. Só que, conforme a conversa avançava, percebi que não era bem assim. A diferença não estava só nos detalhes: estava na forma como cada uma de nós interpretou o que viveu.
Para ela, certos episódios foram engraçados; para mim, tinham sido tensos. Para mim, algumas situações eram apenas corriqueiras; para ela, tinham um peso enorme. Foi estranho perceber como duas pessoas podem estar no mesmo ambiente, vivendo a mesma cena, e guardarem memórias tão distintas, quase como se estivéssemos em histórias diferentes.
Talvez seja porque, quando somos crianças, cada idade enxerga o mundo por uma lente particular. Ou talvez porque o que marca a vida de um, passa despercebido para o outro. Mas a verdade é que, ao ouvir minha irmã, me vi revisitando lugares dentro de mim que eu nem sabia que ainda existiam. E também me vi acolhendo versões da nossa história que, até então, eu desconhecia.
A viagem nos deu novas lembranças para guardar, e, de quebra, recontou as antigas, só que sob a luz de outro olhar. E talvez seja isso o mais bonito: perceber que, mesmo quando a vida nos leva por caminhos diferentes, a gente continua sendo coautoras da mesma narrativa, ainda que cada uma escreva seu capítulo com palavras próprias.