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Uma mostra

Janelas do Japão lembram os tempos antes da Covid

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Autor/Imagem:
Carolina Paiva, Edição

Houve época, antes da pandemia, que os tempos de convívio social, era nas varandas – que não deixam de ser janelas grandes – que recebíamos amigos e fazíamos o churrasco de domingo. Enquanto no Brasil a vista é sinônimo de continuidade da vida, no Japão ela tem um aspecto contemplativo e introspectivo. Exatamente por isso, a janela foi escolhida como tema da nova exposição da Japan House, aberta nesta terça, 29, em São Paulo.

Na arquitetura tradicional japonesa, as portas e janelas exercem um papel importante de transição. “Tudo é um único espaço durante o dia que pode se particionar a partir do uso desses painéis”, explica o arquiteto Lourenço Gimenes, que assinou o projeto da Japan House São Paulo ao lado do arquiteto japonês Kengo Kuma. “E aí está um pouco da graça, talvez, da leitura das janelas na arquitetura japonesa: o grau de transformação da luz, ou seja, o tanto que você deixa essa luz entrar e a forma como você deixa ela entrar é o que define o uso e a privacidade e a característica daquele ambiente.”

Já do lado de fora, as portas e janelas têm a função de recortar a paisagem. É através dela que a natureza é enquadrada e passa a fazer parte da própria casa, como um quadro. “Se a gente pensar, em termos de comportamento, a gente meio que descreveu o brasileiro e o japonês. Essa expansividade, informalidade, superficialidade de ver tudo e não ver nada, e no Japão tem uma delicadeza de mexer para transformar o espaço, o enxergar um aspecto específico do jardim. O japonês é um povo muito observador, reservado, e isso encontra um eco na forma de como eles constroem os próprios espaços deles, uma maneira delicada e afastada”, resume Lourenço.

“A minha impressão é de que no Brasil a gente tem uma sorte muito grande de ter muita luz, de ter muito vento, de ter muita paisagem e talvez não exista uma valorização consciente da mesma maneira que se tem no Japão. Há uma lógica de abundância aqui, em muitas frentes, que talvez mude a nossa forma de valorizar”, opina a diretora cultural Natasha Barzaghi.

O estudo de Janelas no Japão esteve em exposição pela primeira vez em Tóquio, em 2017, para celebrar os dez anos de fundação. A partir daí, passou a fazer parte de um programa de itinerância implantado pelo Ministério das Relações Exteriores do Japão. Por isso, esteve em sua versão online na Japan House de Los Angeles, depois de São Paulo, e seguirá para o centro de Londres.

Só pelo fato de o país ter um instituto que pesquisa janelas há mais de dez anos já não é necessário explicar a importância do elemento na arquitetura e cotidiano do Japão. Na exposição, três chamam atenção. A primeira é uma réplica em tamanho real (escala 1:1) feita de papel artesanal japonês (washi) de uma casa de chá, a yousui-tei, que tem o nome especial de “a casa das 13 janelas”. “Acredito que não haja uma arquitetura assim em outro lugar do mundo, sendo tão pequeno e com tantas aberturas. Normalmente, uma exposição de arquitetura, diferente de uma de arte, não se pode levar a obra real, pois não há como exibir em tamanho real, exceto as salas de chá”, pontua Igarashi Taro.

Também chama atenção a importância da janela no trabalho manual, ambientes nos quais elas possuem lugar de destaque, inserindo ou expulsando elementos como a luz, o vento, o calor, a fumaça, que alteram características de materiais como a argila e a madeira e comidas como o nabo defumado, o caqui seco e o yuba, uma nata seca de leite de soja. Para garantir uma experiência multissensorial para o visitante, o restaurante do espaço cultural servirá algumas destas comidas.

Apesar de focar no Japão mais tradicional, a mostra também traz exemplos da arquitetura contemporânea, com exemplos de janelas inusitadas fotografadas pelo fotógrafo francês Jérémie Souteyrat em sua coletânea de fotos Tokyo no ie (As casas de Tóquio, 2014). “Isso mostra como a janela, mesmo nos centros urbanos, onde a vida tem uma outra característica, outra necessidade, também têm uma importância”, diz Natasha.

A mostra também conta com uma programação paralela online e conteúdos compartilhados por meio das redes sociais da Japan House São Paulo. A estreia da exposição marca a volta da Paulista Cultural. “Há três anos, a gente criou a Paulista Cultural, que são as sete instituições culturais da Paulista (Casa das Rosas, Sesc Avenida Paulista, Itaú Cultural, Centro Cultural Fiesp, Masp e Instituto Moreira Sales) para cruzar programações e valorizar a Paulista como polo cultural”, explica Natasha.

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