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Dia de clube

Jojô, a menina serelepe e o ‘galo’ no amiguinho

Publicado

Autor/Imagem:
Eduardo Martínez - Foto Reprodução

A menina corria serelepe pela casa dos avós. Ela acabara de saber que iria passar o próximo domingo na companhia dos tios no clube. “Se aquieta, Maria Alice!”, a avó tentava conter o arroubo de alegria da neta, que parecia não prestar atenção naquelas palavras, talvez, sem sentido, ainda mais para ela, que era filha única e necessitava, mais que a maioria, da companhia de outras crianças.

Já no sábado, ela foi dormir na casa da tia, ali na Asa Norte. Ela já queria acordar no dia seguinte e ir logo pro clube. Ansiosa como ela só, não pregava os olhos. Rolava tanto na cama, que a tia, preocupada, colocou um colchão no chão para proteger a criança, caso caísse. O tio, no outro quarto, também estava eufórico com o dia seguinte. Ele não era menino há décadas, mas agia como tal sempre que a mulher avisava que iriam ao clube. Adorava piscina! Coisa de menino.

A Maria Alice e o tio foram os primeiros a levantarem no dia seguinte e logo começaram a preparar as coisas. A tia levantou mais tarde, abriu a cortina do quarto e olhou o céu cinza. Levantou-se ainda com preguiça, calçou os chinelos e foi ao banheiro. Depois foi ver o que a sobrinha e o marido estavam aprontando. Encontrou-os tomando café. A menina, com um grande naco de pão na boca, sorria com todos aqueles dentes de criança. O marido bebia aquele café preto com algumas gotas de adoçante.

– Não vai dar pra irmos ao clube.

– Por quê, tia?, a menina abriu tanto a boca, que quase deixou aquele resto de pão cair.

– O tempo está ruim.

A Maria Alice voltou o rosto para o tio, esperançosa de um alento. Ela acreditava nas palavras dele, que sempre vinha com pontas de esperança.

– No clube é diferente! Sempre tem sol!, o tio disse olhando para a sobrinha.

O rosto da menina voltou a sorrir. A tia, que conhecia bem o marido, tentou sorrir, mas aquele humor azedo, amigo de praticamente todas as manhãs, não a impediu de torcer a boca e disse:

-Que história maluca é essa de que no clube não chove?

– Você não sabia? Ih, Maria Alice, ela não sabia disso!

– Tia, todo mundo sabe disso!

Terminaram de comer, a tia se levantou e foi para a sala, onde se sentou no sofá, pegou o controle ao lado e ligou a enorme televisão. Parecia determinada a passar um bom tempo ali. No entanto, logo a menina a puxou pelo braço.

– Vamos, tia!

– Se aquieta, Maria Alice!, a tia repetiu as mesmas palavras da sua mãe.

A menina, quase chorando, buscou os olhos do tio, na esperança de que ele a salvasse daquele momento desesperador tão angustiante, mas que muitos adultos já se esqueceram. Ele se sentou perto da esposa, a abraçou, lhe deu um beijo carinhoso na face esquerda. Nada disse, simplesmente colocou a mão sobre a dela, que desligou a televisão e foi se arrumar.

Poucos minutos depois, talvez uns 10 ou 15, que pareceram horas para a menina, lá estavam todos dentro do carro. O portão automático da garagem se abriu e o veículo tomou a rua, quase deserta. Mal chegaram no final da via, começou a chover. Uma chuva forte!

– Tá chovendo! Vamos voltar!

– Tia, no clube sempre faz sol!

A chuva parecia não querer dar trégua, cada vez mais forte. Mas lá ia o tio dirigindo o veículo, a mulher com cara de poucos amigos ao lado, a Maria Alice, atrás, ia confiante nas palavras do tio. Faltava não mais que um quilômetro para chegarem ao destino quando, de repente, lá estava um céu iluminado pelo astro-rei. O tio simplesmente se virou para a esposa, que sorriu. Ele observou, pelo retrovisor, o rosto da sobrinha, que estava radiante.

Assim que entraram no clube, colocaram as bolsas numa mesa embaixo de uma barraca e foram direto fazer exame para poderem entrar na piscina. Cada um ganhou uma pulseira. A menina e o tio correram para a piscina, enquanto a tia caminhou a passos lentos para a barraca, onde pediu uma caipirinha e se espreguiçou.

A Maria Alice e o tio, agora mais menino que nunca, brincaram na piscina. Era uma alegria radiante, que se espelhava no rosto daqueles dois. Crianças! Coisas de crianças! Elas vivem um mundo mais divertido, que a grande maioria dos adultos nem sequer se lembram que existe.

Após algumas horas, a tia foi até a piscina, onde se juntou àquelas duas crianças, que ainda estavam com o maior pique. Ela passou passou alguns minutos se refrescando naquela água, talvez um pouco mais fria que o esperado.

– Maria Alice, você precisa comer alguma coisa.

– Ah, tia, não estou com fome!

– Você tem que comer alguma coisa! Vou pedir alguma coisa pra gente agora.

A tia se dirigiu à lanchonete. A menina e o tio ficaram ali na piscina. O pedido chegou, a tia foi até a grade que cercava a piscina e acenou para os dois, que acataram a ordem. Emburrados, saíram da piscina, mas logo o sorriso voltou aos olhos daquelas duas crianças: Batata frita!

Comeram tanto, mas logo quiseram voltar pra piscina. A tia disse que não, que deveriam aguardar um pouco. Aguardaram e aguardaram. Aqueles minutos lentos como lesmas, fizeram a menina olhar para a outra piscina, logo ali ao lado. Um mundaréu de pirralhos correndo de um lado para outro, escorregando pelo tubo de plástico até as águas rasas.

– Tia, posso ir?

– Vai lá. Mas cuidado!

A menina correu mais do que nunca. No entanto, chegou timidamente na piscina, entrou como se pedisse permissão. Mas isso não durou mais do que meros segundos. Logo uma outra menina a chamou para entrarem naquele tubo de plástico e escorregarem. Eufóricas, subiram as escadas, desceram escorregando, subiram as escadas novamente, desceram, subiram, desceram… Não sei quantas vezes ficaram ali. Criança não se aquieta mesmo!

Enquanto isso, o tio já havia ido e voltado da piscina duas ou três vezes. Agora, sentado debaixo da barraca, ouvia a esposa contando as notícias. De vez em quando eles comentavam sobre os ocorridos, até que apareceu a Maria Alice, com uma das mãos na testa e cara de choro. Nenhuma lágrima! Até para chorar, a menina era tímida. A tia, muito preocupada, lhe perguntou o que havia acontecido, no que ela respondeu que, durante uma das subidas das escadas, deu um encontrão com um menino. Testa com testa! Isso dói! Como dói!!!

A Maria Alice disse que o menino saiu chorando da piscina e foi direto para a mãe. O tio se levantou e foi pegar um pouco de gelo na lanchonete para colocar no galo que já despontava na cabeça da menina. Ao retornar, enrolou o gelo numa blusa e pediu para a Maria Alice ficar segurando bem em cima do galo.

– Sabia que eu vi a mãe do menino chorão procurando por você? Ela perguntava pra todo mundo: você é a Maria Alice?

– Vamos embora, tio! Ela vai me bater!

– Vai nada! Basta mudar o seu nome. Você quer se chamar como?

A menina pensou brevemente e disse que gostava de Joelita, que era o nome da sua professora. Então, o tio começou a chamar a Maria Alice de Joelita. Dessa forma, a Maria Alice, agora Joelita, ficou mais tranquila e, mesmo com aquele galo enorme querendo cantar, ela achou graça de tudo e começou a rir, até que chegou a hora de irem embora.

Os tios da Joelita a deixaram na casa da avó, onde os pais a pegariam mais tarde. Ela ficou com aquela pulseirinha durante muito tempo, apesar dos protestos dos pais. A Joelita, depois de um tempo, deixou de ser chamada por esse nome. É que o seu tio começou a chamá-la de Jojô. Aquele galo já sumiu faz tempo. Mas o apelido continua. Na família, todos sabem quem é a Jojô.

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