Curta nossa página


Crítica literária

Jorge Amado e o Engajamento do Artista

Publicado

Autor/Imagem:
Daniel Barros - Foto Divulgação

Começar esta resenha com “Acabei de ler Hora da Guerra” talvez não fosse o ideal, principalmente tratando-se de uma obra tão significativa. O livro reúne crônicas escritas entre 1942 e 1945, publicadas na coluna de mesmo nome no jornal baiano O Imparcial, pelo escritor Jorge Amado. Vale ressaltar que há divergências sobre o local exato de nascimento de Amado. Alguns biógrafos afirmam que ele nasceu na Fazenda Auricídia, então município de Ilhéus, posteriormente pertencente a Itajuípe. No entanto, foi registrado no povoado de Ferradas, em Itabuna-Bahia. Independentemente do local, o que importa é o comprometimento do autor, conhecido por Capitães da Areia, em demonstrar paixão pela democracia e indignação contra o fascismo e seus colaboradores, a chamada quinta-coluna.

Escritores em Armas

Nas crônicas, Amado conclama todos a combaterem a quinta-coluna e o nazi-fascismo, enfatizando que não importa o tipo de arma, desde que a luta seja travada. Ele valoriza a escrita e as artes como ferramentas de resistência contra o fascismo:

“Estão de armas em punho e já hoje há uma consciência de que a pena ou a máquina de escrever são armas tão mortais e necessárias quanto o fuzil e a metralhadora.”

Ao mesmo tempo, Amado demonstra indignação com a Academia Brasileira de Letras, criticando a falta de conhecimento dos acadêmicos sobre a guerra e suas implicações. Ele questiona, por exemplo, condecorações recebidas por Gustavo Barroso, sugerindo que algumas podem ter origem na Alemanha nazista.

A necessidade de engajamento cultural e político era fundamental, sobretudo para impedir que os quislings — termo derivado de Vidkun Quisling, militar norueguês e colaborador de Hitler — entregassem o país aos inimigos, como aconteceu na França com Pierre Laval e Pétain.

Contexto Latino-Americano e Brasileiro

Amado contextualiza o cenário internacional, mostrando que governos latino-americanos eram, em sua maioria, simpáticos ao Eixo. Na Argentina, Ramón Castillo defendia a neutralidade pró-Eixo, sucedendo-se depois Pedro Pablo Ramírez, Farrell e Juan Perón, mantendo políticas alinhadas. No Paraguai, Morínigo perseguia democratas e opositores ao fascismo; na Bolívia, Peñarando apoiava as Nações Unidas em política externa, mas reprimia líderes democráticos internamente.

No Brasil, a situação não era diferente. Plínio Salgado e seus seguidores, como Gustavo Barroso e Otto Maria Carpeaux, formavam a quinta-coluna brasileira, pleiteando censura a livros e traduções publicadas por editoras nacionais. A resposta dos escritores brasileiros foi mobilizar-se contra a censura, defendendo a liberdade de expressão e a arte como instrumento de resistência.

⚠️ Reflexões Sobre o Fascismo Hoje

O livro nos faz refletir sobre novos grupos neonazistas, que ainda hoje desconhecem os horrores praticados por Hitler. Jovens empunhando bandeiras fascistas, com tatuagens de suásticas, ignoram completamente as leis de Nuremberg, os planos do regime para colônias africanas e sul-americanas e a realidade de que, em campos de concentração, não haveria distinção para mestiços ou latino-americanos.

Amado evidencia que a quinta-coluna e os oportunistas agem em benefício próprio, obedientes enquanto estão em posição de poder, mas prontos para trair quando percebem uma mudança no cenário político. Durante a derrota do Eixo, tentaram negociar acordos de paz em países como Espanha, Portugal e Itália, tentando manter viva a ideologia nazista. No entanto, as principais potências — União Soviética, Inglaterra e Estados Unidos — só admitiram a derrota incondicional.

Hora da Guerra: Uma Lição de Engajamento

Hora da Guerra não é apenas uma coletânea de crônicas; é um testemunho histórico e político, um chamado à ação para todos os cidadãos conscientes. Jorge Amado mostra-se aguerrido e apaixonado pela liberdade, lembrando que o artista tem responsabilidade social e que a escrita pode ser uma arma poderosa contra o fascismo e a injustiça.

Um livro indispensável para compreender não apenas o contexto histórico da Segunda Guerra Mundial, mas também o papel do escritor e do artista na defesa da democracia.

Em tempos atuais, quando movimentos extremistas tentam se reerguer, as lições de Amado continuam vivas e necessárias, demonstrando que a cultura e a arte podem influenciar consciências e preservar a liberdade.

Publicidade
Publicidade

Copyright ® 1999-2025 Notibras. Nosso conteúdo jornalístico é complementado pelos serviços da Agência Brasil, Agência Brasília, Agência Distrital, Agência UnB, assessorias de imprensa e colaboradores independentes.