Elucidação do mistério
Literatura Policial: História, Estilos e Grandes Nomes
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O gênero policial se caracteriza pela presença do crime, da investigação e do malfeito, tendo como foco a elucidação ou resolução do mistério. Além disso, apresenta uma dimensão ética: politicamente, propõe que o crime não compensa. Essa é a definição clássica do gênero.
As Origens: A Lógica e a Dedução
Para compreender a literatura policial, é necessário voltar aos romances de aventura, intimamente ligados ao início do gênero. Com o tempo, a introdução do raciocínio lógico e da dedução foi transformando a aventura em algo que hoje reconhecemos como clássico policial.
Em 1747, Voltaire publicou Zadig ou O Destino, em que o protagonista, através da dedução, descreve com precisão uma cadela recém-parida e o cavalo do rei, sem nunca tê-los visto. Acusado injustamente de roubo, Zadig revela como a lógica e a observação minuciosa podem conduzir à verdade — mesmo que, ironicamente, seja obrigado a pagar uma multa pelos erros dos magistrados.
Nos romances de aventura, heróis como Ivanhoé, Robin Hood e Rei Artur predominavam pela ação, superando a lógica fria com valentia e força. Com o tempo, o romance de aventura evoluiu em três fases:
Expansão do espírito aventureiro, mantendo a ação como centro;
Espionagem, onde a intriga já era relevante, como em Milady, de Alexandre Dumas;
Romance policial, no qual a lógica e a dedução se tornam preponderantes, substituindo a força física.
As Regras do Romance Policial
No início do século XX, S.S. Van Dine estabeleceu vinte regras do romance policial, norteando a criação de obras consistentes: recomendava verossimilhança, sem riscos ao detetive ou distrações com sua vida amorosa. Embora limitado, esse modelo deu origem a novas vertentes, como o noir, em que o investigador corre riscos, enfrenta violência, problemas amorosos e tramas complexas.
No Brasil, Rubem Fonseca é referência desse estilo, tendo sido comissário de polícia antes de se tornar escritor. Obras como Bufo & Spallanzani, O Cobrador e Mandrake (que virou série na HBO) consolidaram sua reputação.
No cenário internacional, Raymond Chandler influenciou o romance policial moderno com seu personagem Philip Marlowe, também adaptado para o cinema (À Beira do Abismo). Meu próprio romance, Enterro sem Defunto, segue esta linha noir, mas, como observa o crítico Maurício R. B. Campos, foge do estereótipo: “Estamos no Brasil, nos arredores de Brasília ou em uma praia de Maceió. O tom é colorido, longe do preto e branco ianque.”
Estilos e Abordagens
Além do noir, o gênero policial apresenta outras vertentes:
Interpretativo: o crime já ocorreu e é narrado detalhadamente, como em A Sangue Frio, de Truman Capote, que relata o assassinato brutal de uma família no Kansas, descrevendo a investigação e a reação da população;
Clássico: voltado à dedução e à lógica, como nos contos de Edgar Allan Poe (Dois Crimes da Rua Morgue, 1841; A Carta Roubada, 1845), considerado o pai do gênero policial moderno, com seu detetive C. Auguste Dupin;
Histórico e experimental: relatos de crimes em diferentes épocas, como os contos de Robert van Gulik, inspirados em julgamentos do século VII, ou incursões de autores como Dostoiévski, Balzac, Victor Hugo, Hemingway e Charles Dickens.
Conclusão
Seja pelo mistério e dedução, seja pela proximidade com a vida real e seus conflitos, a literatura policial continua a fascinar. De Edgar Allan Poe a Rubem Fonseca, passando por Raymond Chandler e Truman Capote, o gênero permanece presente entre os melhores da ficção, com múltiplas possibilidades de estilo e abordagem.
O policial nos atrai não apenas pelo crime em si, mas pelo desafio intelectual e pela revelação das complexidades humanas. É, sem dúvida, um gênero que combina entretenimento, raciocínio e reflexão social.