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Maely tinha casa com poster de Rollemberg. E a Agefis derrubou tudo

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Maely. Assim, com ípsilon. Pode até lembrar nome de princesa, de filha de deuses gregos, mas é apenas uma mulher esforçada, batalhadora, que paga 400 reais de aluguel por um cômodo no Por do Sol, onde mora com o marido e o filho de seis anos.

Há pouco tempo, porém, ela realizou o sonho da casa própria. Um mero cafofo, é verdade. Mas era dela. Até que os fiscais da Agefis fizeram os tijolos desmoronarem como um pesadelo.

A casa de Maely foi ao chão. Mas as dos vizinhos, algumas até mais imponentes, continuam em pé. É como se desafiassem uma Justiça que dirige o olhar brando para uns e tem os olhos vedados para outros.

Evangélica, Maely parece ter pecado ao usar um poster do governador eleito do Distrito Federal Rodrigo Rollemberg (PSB), para fazer as vezes de vidro de uma janela da sua casa humilde. E a história dela, que circula nos locais onde trabalha, sensibiliza e emociona quem ouve.

O Por do Sol, distante pouco mais de 30 quilômetros do centro de Brasília, é a segunda maior favela da América Latina. Foi lá que Marina Silva, ao lado de Rodrigo Rollemberg, lançou sua candidatura ao Palácio do Planalto. E é desse aglomerado de gente supostamente esquecida por Deus, que Maely sai da cama de domingo a domingo, às 4 horas da madrugada, para chegar a uma padaria em Águas Claras antes das 6h. Ali, ela lava de tudo – de banheiros a formas de pão  –, para receber mensalmente, como auxiliar de serviços gerais, um salário mínimo.

O salário – o Dieese mostra isso, e a realidade comprova – mal dá para comer. Porém, precisando de dinheiro para realizar sonhos simples, Maely não para. Sai do emprego formal às 14 horas e entra no mundo da informalidade, como diarista. E repete em lares de famílias de Águas Claras a rotina a que se entregou por longas oito horas. Por ser meio expediente, cobra 50 reais. Mas há quem pague mais, satisfeito com o trabalho e o perfume de casa limpa.

O dinheiro das diárias é sagrado. Foi com ele, somadas as sobras de bicos do marido montador de andaimes, que Maely comprou o direito de posse de um lote de 120 metros quadrados em uma das muitas chácaras fatiadas em condomínios populares nos arredores de Brasília. O sonho da casa própria estava a caminho. Faltavam os tijolos, o cimento, a areia, a brita…

Numa tarde em que não havia faxina para fazer, Maely foi bater pernas nos armazéns de material de construção. Por mais humildes que fossem os orçamentos, a conta não batia. A poupança mal pagava três mil tijolos. O que dizer do cimento, das telhas, das ferragens, das janelas… Ah!, maldita janela sem vidro que fez a casa ir ao chão.

Maely ouviu do gerente de uma das lojas a sugestão de recorrer ao Construcard, carteira de crédito especial da Caixa Econômica Federal para a compra de material de construção. Negociou o empréstimo e viu depositados em sua conta corrente 20 mil reais, para amortização em parcelas de 600 reais. Uma vitória para ela, o marido, o filho, os parentes e os amigos.

A casa de 45 metros quadrados foi erguida. Simples como Maely. Mas era dela. O problema estava na janela. O poster de Rollemberg foi rasgado pelos fiscais da Agefis. E as máquinas da Secretaria de Ordem Pública e Social fizeram o resto do estrago. Os tijolos estão no chão, quebrados. Os ferros retorcidos, enferrujados pela chuva que não para de cair, misturando-se às lágrimas de Maely.

Maely Maria Buarque é pobre, mas digna. Recusa o Bolsa Família por acreditar que quem pode, deve trabalhar. Ela não sabe que este texto está sendo produzido. Mesmo porque, não tem internet ou computador em casa. Mas tem uma conta-salário no Bradesco. Quem ficou sabendo da história dela, sinalizou com depósitos de 10, 20, 30, 40 e até 50 reais. Um DOC, uma TED. Com certeza ela tem muitos amigos ocultos, que bem podem fazer as vezes de Papai Noel.

Serviço
Maely Maria Buarque
Banco Bradesco
Agência 2424-4
Conta Corrente 0026777-5

Publicado originalmente em naredecomjoseseabra.com.br

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