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Amor à causa

Maria, de mãe de Jesus a costureira da Capelinha

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Gabriela Moll

A subida até o topo do Morro da Capelinha parece pouco perto dos 40 dias de trabalho que antecedem a tradicional via-sacra de Planaltina. Para vestir os cerca de 1,5 mil atores que integram o grupo, a costureira Maria de Lourdes Maciel, de 67 anos, abre mão dos afazeres profissionais e dedica-se aos preparativos.

A moradora de Planaltina faz parte do grupo da Paróquia de São Sebastião que organiza o evento desde 1973, quando a encenação estreou. Neste ano, será a 44ª edição. De 2008 a 2015, Lourdes interpretou Maria, a mãe de Jesus. “Tenho muito orgulho de fazer parte desse processo; para quem tem fé na evangelização, é uma emoção sem fim”, define.

Desde 1991, ela coordena o setor dos figurinos, que tem cerca de dez pessoas dos cerca de 1,8 mil envolvidos em toda a produção — sendo 1,4 mil deles matriculados no Grupo Via-Sacra, da Paróquia São Sebastião. “Vemos as roupas e acessórios que podem ser aproveitados, o que temos que remodelar e o que tem de ser feito novamente”, detalha.

A poucos dias do Domingo de Ramos — quando haverá a primeira das quatro encenações programadas —, o ateliê preparou para este ano, do zero, cem túnicas de algodão cru, 30 calças, 15 fraldões, 80 mantos, 58 panos laterais (que fica em diagonal por cima da vestimenta) e fez ajustes diversos nos figurinos reaproveitados. O personagem principal, Jesus, é quem demanda o maior número de trajes, com cinco roupas diferentes.

Neste ano, a coordenadora se encarrega pessoalmente de todos os acabamentos do vestido da noiva que será usado no domingo (9), na apresentação da passagem bíblica das Bodas de Caná. De acordo com as Escrituras Sagradas, foi nesse casamento que, a pedido de Maria, Jesus fez o primeiro milagre: transformou água em vinho. Será a primeira vez que a cena integra o ato de Planaltina.

Para pesquisar o que era usado na época, Lourdes recebe ajuda de um dos filhos, o artesão Valterismar Maciel, que participa do grupo desde 1984. Alguns dias antes do evento, ele busca cada um dos espinhos para construir a coroa usada pelo protagonista.

“É uma mistura de sentimentos, desde a produção dos acessórios do Cristo até o momento a ressurreição, no alto do morro”, emociona-se o figurinista. No espetáculo, é ele quem maquia, limpa e veste o ator que encena Jesus.

O espaço de trabalho de mãe e filho fica instalado na residência que serve como depósito para o Grupo Via-Sacra, a Casa Nossa Senhora Aparecida, no Setor Tradicional. Ali fazem-se os serviços de costura e complemento de cenário, como roupas, armas, estandartes e outros acessórios que os soldados usam.

Um capacete demora, em média, um dia inteiro para ser feito, e a demanda é de aproximadamente 100 equipamentos novos. Quem detalha o procedimento é o agente patrimonial Michael Araújo Silva, de 34 anos. “Usamos metal inox, tesoura e cortador manuais para couro”. Desde os 7 anos de idade na via-sacra, há 18 ele interpreta um soldado.

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Ator mirim vira diretor – Há seis anos, as produções são dirigidas por Uarlen Dias, de 32 anos. Nascido em Planaltina, o ator e mestre em direção teatral começou a carreira no palco da Via-Sacra da Criança, aos 8 anos, quando interpretou Pôncio Pilatos. “Passei um tempo de estudos no Chile e, ao regressar, decidi me dedicar à minha comunidade”, conta.

O diretor, que trabalha com outros dois assistentes, explica que a rotina de ensaios começa imediatamente após o carnaval — que neste ano terminou oficialmente em 28 de fevereiro. Os elencos são preparados separadamente, por dia de apresentação, e os ensaios gerais ocorrem aos domingos. “Os únicos que ensaiam todos os dias, sem exceção, somos eu e Jesus.”

Uarlen ainda planeja uma surpresa referente ao tema do ano — Fazei tudo o que Ele vos disser, frase que, segundo a Bíblia, Maria disse a Jesus nas Bodas de Caná — e adianta que Cristo subirá ainda mais alto do que no ano passado, quando ele foi erguido a mais de 30 metros de altura. Quatro voluntários cuidam da coordenação de sonoplastia e iluminação, executada por parceiros.

A escolha do tema de 2017 é uma homenagem aos 300 anos que a imagem de Nossa Senhora Aparecida foi encontrada no Brasil e aos 100 anos que a imagem de Nossa Senhora de Fátima foi vista em Portugal.

No Domingo de Ramos (9), serão encenados milagres de Cristo; depois, já na Semana Santa, na quinta-feira (13), a Santa Ceia e a prisão de Cristo; na Sexta-Feira Santa (14), o espetáculo principal da Paixão e Ressurreição; e, no sábado (15), a versão infantil.

Advogado será Jesus – Desde os 20 anos de idade no elenco, o advogado Marcelo Augusto Ramos, de 29 anos, interpretará Jesus Cristo pela quarta vez. “É como uma Quaresma para nós, católicos, que nos colocamos à disposição de uma obra como essa”, define.

Marcelo conta que a escolha dele para o papel ocorreu de forma inesperada. “Fui um pouco relutante no início pela responsabilidade, mas decidi aceitar com o coração aberto.”

Ao assumir o personagem, costuma ser confundido com o próprio Jesus no resto do ano. “Represento um símbolo de paz, de amor e me esforço para ser esse instrumento em todos os momentos da vida.”

Para ensaiar, o advogado concilia o serviço formal e o trajeto de casa, em Arniqueiras, até Planaltina. “É um trabalho árduo, mas estou me doando para Deus”, acredita.

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Outro personagem que também é confundido pelo público é o psicólogo Sebastião Borges, de 68 anos. Há 30 anos no mesmo papel, ele interpreta Anás, sarcedote que condena Cristo pela primeira vez e o conduz ao Calvário para ser preso.

“As pessoas ficam desesperadas neste momento, tenho que me esconder para não brigarem comigo”, diverte-se o morador de Planaltina. Ele é o integrante mais idoso do elenco. “Enquanto eu tiver forças nas pernas, vou atuar nesta peça até o fim da minha vida”, garante.

Programação – As encenações abertas ao público começam no domingo (9), a partir das 15 horas, quando atores iniciam a procissão acompanhados por fiéis.

Montado em um jumento, o intérprete de Jesus Cristo sai da igreja São Leonardo Murialdo, no Jardim Roriz, e passa por outras paróquias da região em um trajeto de cerca de 12 quilômetros.

Por volta das 20 horas, o grupo chega para a missa no estacionamento do Ginásio de Múltiplas Funções de Planaltina, ao lado da administração regional. Após a celebração, no espetáculo do Domingo de Ramos, começa a encenação de milagres de Cristo.

Na Quinta-Feira Santa (13), o elenco representa, a partir das 20 horas, a Santa Ceia e a prisão de Cristo. Para os atos no palco do estacionamento são esperadas cerca de 10 mil pessoas.

A principal parte da via-sacra é na Sexta-Feira Santa (14), no Morro da Capelinha, depois das 16 horas. Partindo do centro de Planaltina, em um percurso de aproximadamente 7 quilômetros — o trajeto da base ao topo do morro tem cerca de 1 quilômetro —, os atores mostrarão a morte e o momento da ressurreição de Jesus.

A programação ainda prevê a Via-Sacra da Criança, com 230 artistas mirins, a partir das 16h30 do sábado (15). O domingo de Páscoa (16) fechará as celebrações com shows de bandas católicas. Ambas as atrações ocorrerão no estacionamento próximo à administração regional.

Além dos voluntários e doadores, o projeto é possível por meio de emendas parlamentares dos deputados distritais Claudio Abrantes (Rede) e Ricardo Vale (PT), executadas via Secretaria de Cultura. A verba, no total de R$ 1,1 milhão, é usada para custear a infraestrutura.

Serviço

Domingo de Ramos
9 de abril (domingo)
Procissão, às 15 horas
Saída da Igreja São Leonardo Murialdo, no Jardim Roriz
Missa e encenação, às 20 horas
No estacionamento do Ginásio de Múltiplas Funções de Planaltina (ao lado da administração regional)

Santa Ceia e prisão de Cristo
13 de abril (quinta-feira)
Às 20 horas
No estacionamento do Ginásio de Múltiplas Funções de Planaltina

Morro da Capelinha
14 de abril (sexta-feira)
A partir das 16 horas

Via-Sacra da Criança
15 de abril (sábado)
Às 16h30
No estacionamento do Ginásio de Múltiplas Funções de Planaltina

Páscoa
16 de abril (domingo)
Às 19 horas
Shows de bandas católicas
No estacionamento do Ginásio de Múltiplas Funções de Planaltina

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