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Tango lulista

Massa começa derrubando por várias cabeças o favorito Milei

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Autor/Imagem:
Mathuzalém Júnior* - Foto de Arquivo/Reprodução das Redes Sociais

Diz o ditado maquiavélico que onde o Diabo jaz tudo dá para trás. No português abrasileirado, é o mesmo que dizer que, quando a maré é de azar, o urubu de baixo caga na cabeça do de cima. Contrariando a lei da gravidade e todas as expectativas, foi o que aconteceu com a eleição presidencial da Argentina, com a presença de um preposto da família Bolsonaro. Líder das prévias, o maluquete ultraliberal, ultradireita e antissistema Javier Milei perdeu o favoritismo e deve perder a chance de brigar com o Brasil, de dolarizar a economia local, eliminar os subsídios e os programas sociais, de acabar com o Banco Central, de revogar a lei do aborto, entre outras propostas absurdas. Tudo indica que não será dessa vez. É a sina daqueles que se aproximam do ex-mito.

Representante da antipolítica, Milei começou a cair em desgraça quando disse quem eram seus principais gurus: Donald Trump e Jair Bolsonaro, criador e criatura e ambos envolvidos em falcatruas que juraram combater antes de se apossarem do poder, do qual só saíram após ameaças de peia. Fora as barbáries que negociaram, articularam e estimularam em nome de Deus e dos patriotas mal-acostumados com as benesses públicas. Caricato e também conhecido por “Peruca”, Javier Milei tem outro ídolo marcante: Nayib Bukkele, o polêmico e linha-dura ditador de El Salvador.

Tão bom economista e político como jogador de futebol, músico e filho, Milei tem tudo a ver com o bairro onde nasceu: Palermo. Não à toa, sua biografia não autorizada é intitulada “El Loco”. Supostamente ligado a uma nova força política, o goleiro de quinta categoria tomou um frango sem asas do peronista e azarão Sergio Massa, que fechou o primeiro turno com mais de 36% dos votos, contra 30% de Milei, que tem a cara do bolsonarismo. Fenômeno observado nos últimos tempos em várias disputas pelo mundo, a polarização entre Massa e Milei reflete o que ocorreu no Brasil em 2028 e 2022: de um lado, a luta pela democracia; de outro, o desprezo pela vida e pela paz.

Lá como aqui, os argentinos estão divididos em manter o Estado Democrático de Direito ou apostar em um candidato de quem o que mais se conhece, além do ranço contra Luiz Inácio e contra a família Kirchner, são as aventuras rocambolescas e populistas para derrubar a cambaleante esquerda. O resultado deverá ser a provável ressurreição da insepulta turma de Juan Domingo Perón. O jogo está aberto, mas seis pontos de vantagem não são desprezíveis. Pelo contrário. Lula que o diga. De acordo com especialistas portenhos, os votos de Patrícia Bullrich, terceira colocada no pleito, serão fundamentais para um e outro candidato.

Como os iguais se atraem em qualquer lugar do desplugado mundo da extrema-direita, o deputado Eduardo Bolsonaro e o ex-ministro Ernesto Araújo foram em comitiva acompanhar as eleições na Argentina, onde tem de haver choro, tristeza e tango, sob pena de virar uma reunião dominical entre Valdemar Costa Neto e Jair Messias. Para não perder o costume, Eduardo e Ernesto voltaram de lá endossando o fajuto discurso de apoiadores de Milei, que falam em suposta fraude. Igualzinho o clã liderado pela assombração e o povo fechado com o que sobrou do bolsonarismo. Para eles, derrota é sinônimo de fraude. Foram e passaram vergonha. O filho 03 teve sua entrevista à rede de televisão argentina C5N interrompida ao defender o porte de arma como “legítima defesa”.

Não sei quem o chamou por lá, mas o parlamentar brasileiro certamente confundiu o país vizinho com a Casa de Mãe Joana dos tempos em que o governo era comandado pelo zero zero à esquerda. Eduardo Bolsonaro obteve como resposta do jornalista apresentador Gustavo Sylvestre a lembrança da generosidade da Argentina e dos argentinos em receber “esse tipo de gente…” “Por isso é que os brasileiros, com lógica, tiraram seu pai do poder”. É aquela velha máxima de que quem diz o quer, ouve o que não quer. Mais uma vez, 03 perdeu a chance de ficar calado. Quanto a Milei (sósia político de Jair Messias), os que o carregam nos ombros merecem o fardo. Sobre seu ídolo brasileiro, não posso formar bom conceito de quem não tem boa opinião de pessoa alguma. Telespectador privilegiado do pleito portenho, Lula ficou de longe e, pelo menos até agora, soprou para o abstrato Milei apenas um verso de Carlos Gardel: “Por una cabeza de um noble potrillo”. Na verdade, o nobre porto ganhou por várias cabeças.

*Mathuzalém Júnior é jornalista profissional desde 1978

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