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Hipocrisia covarde

Mesmo sem golpismos e patifarias políticas, Canadá jamais será destino

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Autor/Imagem:
Armando Cardoso - Foto de Arquivo

Durante os debates populares da COP 30, me chamou a atenção uma canção antiga, mas de recado atualíssimo. De autoria de Celso Viáfora e magistralmente interpretada por Nilson Chaves, ambos paraenses de Belém, a letra da música Não vou sair lembra que a geração da gente (a deles, a minha e a de milhões de brasileiros acima dos 50, 60 e 70 anos) não teve muita chance de se afirmar, de arrasar, muito menos de ser feliz enquanto jovem. A ditadura militar, a mesma que os bolsonaristas tentaram recuperar, nos impediu de viver a plenitude da juventude.

Por isso, “sem nada pela frente, pintou aquele lance de se mudar, de se mandar deste país”. Conforme a canção, o resultado é que muita gente partiu para o Canadá. Hoje os que fogem sem razão se aboletam nos Estados Unidos de Donald Trump e em Portugal. Acreditando no futuro democrático que estamos vivendo, eu preferi ficar no já vou já, “pois quando estava me arrumando para ir, bati com os olhos no luar brasileiro e eu fui que fui ficando”. E aqui estou pronto para continuar lutando pela liberdade.

A exemplo de Celso Viáfora, imaginei as tantas milhas de distância, a tristeza dos invernos, a soberba dos mais ricos e a frieza de um povo que não era o meu. Finquei raízes e jurei que jamais iria sair. Nunca sairei do meu lugar. E não sairei porque as coisas mudaram e mudarão ainda mais depois que os velhos picaretas de Brasília perceberem que eles não são eternos. Com a assombração está bem próxima da jaula, pelo menos me sobra a certeza de que “pior do que foi e pior do que está não vai ficar”.

É verdade que no Canadá não há patifarias políticas, golpismos, radicalismos hipócritas e desconexos e a necessidade congênita de trabalhar contra a própria pátria. Também é verdade que lá parlamentares não se matam pelo poder. Talvez morram pelo povo e por aqueles que para lá se foram. Assim como nas nações com políticos sérios, no Canadá ladrões do dinheiro público não são covardes como os nossos. Se suicidam tão logo são descobertos. Desse modo, evitam vergonha maior para a família.

Por aqui, as famílias de políticos se envergonham quando não conseguem matar aqueles que supostamente lhe tiraram o poder e a boquinha. No Brasil da COP 30 falta vergonha. Prova disso são os deputados e senadores que mancham a imagem do Legislativo. Esses fazem parte do expressivo grupo que, durante o mandato, se apropria do poder outorgado pelos eleitores para usar o dinheiro público em benefício próprio ou de seu núcleo familiar.

Vergonha maior é não haver críticas por parte da elite que partiu para os EUA ao fato de que, em 2026, os partidos políticos terão R$ 6,4 bilhões do Orçamento da União. É mais uma das safadezas do Legislativo contra a sociedade brasileira. E daí? A praxe é as excelências se reunirem para, em uníssono, lembrar que o povo é somente mais um detalhe. Ou seja, como o deles está garantido, o governo e o povo que se virem. Nada mais hipócrita. Hipocrisia é quando esses mesmos tomadores do que é público se unem para dizer que Lula é o perdulário. Vamos que vamos, mas nunca para o Canadá.

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Armando Cardoso é presidente do Conselho Editorial de Notibras

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