Sinônimo de inferno
‘Nel Blu Dipinto Di Blu’, Giorgia… e sem extremismo
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No Brasil, é comum ouvir pessoas dizendo com orgulho: “sou descendente de italiano”. Em algumas regiões do país, esse orgulho ganha forma concreta — há comunidades inteiras onde ainda se falam dialetos derivados do italiano, onde a culinária, os costumes e até o sotaque denunciam a ancestralidade europeia. São famílias que se agarram à memória de um bisavô ou trisavô que, muitos anos atrás, deixou para trás a pobreza da Itália e embarcou rumo ao Brasil com a esperança de uma vida melhor.
Esses imigrantes não chegaram aqui como invasores ou colonizadores. Vieram como pobres, como gente que fugia da fome, do desemprego, de um continente em crise. E, ao chegar, encontraram um Estado brasileiro que, naquele momento, foi generoso: cedeu terras, ofereceu moradia, abriu espaço para que pudessem plantar raízes. Trabalharam duro. Suaram sob o sol tropical para que os filhos e netos tivessem oportunidades. Foram milhares de histórias como essas.
Hoje, muitos dos descendentes desses imigrantes sonham com o reconhecimento da cidadania italiana, com base no princípio do jus sanguinis, o direito de sangue. Não só por vaidade, mas por um sentimento profundo de pertencimento a uma cultura que sempre cultivaram com carinho. Mantêm viva a língua, celebram as festas, valorizam a gastronomia, sentem-se, de algum modo, ainda ligados à terra de origem de seus antepassados.
Mas na última terça-feira, 20, a Câmara dos Deputados da Itália aprovou uma lei que limita esse direito de cidadania apenas a filhos e netos de italianos. Como se o sangue italiano, tão valorizado por esse próprio critério, tivesse prazo de validade. Como se a herança cultural pudesse ser ignorada após a segunda geração. Como se os laços construídos com tanto zelo aqui do outro lado do oceano não tivessem mais importância.
É triste. Uma pena ver a Itália, agora sob um governo de extrema-direita, caminhar por essa estrada estreita e excludente. Porque, ironicamente, muitos dos brasileiros descendentes de italianos que vivem aqui hoje demonstram mais amor, mais respeito e mais orgulho pela cultura italiana do que muitos daqueles que nasceram e vivem lá. Lutam para manter vivas as tradições, transmitem histórias, ensinam os filhos a amar uma terra que, agora, os rejeita.
A Itália fecha as portas para aqueles que nunca a esqueceram. E muitos brasileiros, daqui, seguem cozinhando polenta, dançando tarantela e ensinando os filhos a cantar “Volare”. Mesmo que, para o governo italiano, tudo isso não pareça mais importar.