Reflexo do povo
No circo político, Brasil é palco, eleitor o palhaço e governante, a plateia
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Sem rumo como o vento e medíocre como os que não assumem o que dizem ou fazem, a política brasileira é inapropriada para menores e para idosos. Sobre os políticos, a definição é ainda mais simplória: entre eles a verdade caiu em desuso. Fazendo minha a tese do advogado e filósofo pernambucano Pierre Logan, o problema é que eles não caem do céu. São eleitos, reeleitos e só morrem quando não têm mais voz ou firmeza no controle do que ganharam como parlamentares. Resumindo, sigo os ensinamentos do pensador Reges Cordeiro, para quem “A política é um circo, o Brasil é um palco, nós somos os palhaços e os governantes a plateia”. Simples assim.
Portanto, o Brasil não é para amadores. Como os homens públicos são reflexo do povo, não adianta malhar em ferro frio. Não tenho ideias curtas e jamais pensei em dar um tiro no próprio pé. Por isso, não acredito em promessas de políticos. Para mim e para os que não fazem da idolatria uma forma de ideologia, está claro que é bastante alto o custo de manutenção da ganância, da covardia, do mau-caratismo, da combinação mafiosa, da corrupção e da farra com dinheiro público. Obviamente que excetuando os políticos, quem ganha acima da média no Brasil é criminoso e tem de ser punido com o máximo rigor da lei.
E a norma congressual estabelece que qualquer lei contra o povo deve ser ad-eternum. Ou seja, o Pai Nosso tupiniquim é uma via de mão única. O reino nunca vem a nós. Pelo contrário. A entubação é só no nosso. A ideia da vez é reduzir o custo de água e luz para quem ganha menos de um salário-mínimo. Justo, muito justo, justíssimo. Injusto é a Câmara e o Senado se arvorarem a propor alguma coisa para ser custeada pela classe média, o segmento que menos precisa do governo. Ainda mais injusto é achar que podem enfiar de tudo no ifood do pobre do trabalhador.
Ainda embrionária (ou não), a proposta em análise no Congresso sugere que o brasileiro médio arcaria com a diferença, que seria suposta e igualmente rateada entre todos. Todos, menos suas excelências, que certamente incluirão um parágrafo em uma eventual futura regra para excluí-los do pagamento. Sempre eles que já recebem extra salário uma bolada mensal de vantagens, apelidadas de Cota para o Exercício de Atividade Parlamentar, o chamado “Cotão”, de auxílio-moradia, verba de gabinete, plano de saúde, previdência social especial, foro privilegiado e pensão vitalícia.
O “Cotão” deles inclui reembolso com passagens aéreas, telefonia e serviços postais, manutenção de escritório de apoio, alimentação, hospedagem, fretamento de aeronaves, veículos automotores em embarcações, serviços de táxi, combustíveis e lubrificantes, serviços de segurança, contratação de consultorias e trabalhos técnicos, divulgação da atividade parlamentar, pedágio e estacionamento, além de passagens terrestres, marítimas e fluviais. O nosso exclui tudo isso e ainda nos obriga a votar nessa cambada, sob pena de pecúnia pelo não cumprimento do dever cívico. O pior cenário é quando a religião se alia à política.
Imperador romano de muitas lendas, algumas contradições e afirmações irrefutáveis, Júlio César disse certa vez que a união de religiosos e políticos gera uma “arma perfeita para escravizar ignorantes”. Na linguagem mais popular, um grita mata e o outro esfola. Vivemos essa quadra. O Congresso dispõe de uma bancada evangélica que briga ferozmente e sem crucifixo pela isenção de todo tipo de imposto para as igrejas do ramo. Seus milionários pastores financiam atos antidemocráticos na maior cara de pau. E nós? Enquanto dormíamos, eles destilavam terceiras intenções, exigindo o dízimo com falsas promessas. Não há mais o que fazer. Agora é pagar a conta de luz e orar para que pelo menos a pomada Hipoglós baixe de preço.