Nostálgicas lembranças mantêm vivas as velhas casas em que um dia vivi

Saudades daquelas casas das vovós, ambas localizadas num bairro pobre do Rio de Janeiro, que se desvencilharam, lamentavelmente, dos meus “ricos” dias. Digo “ricos” pois — mesmo diante da presença muda dos familiares mortos (GINZBURG, 2020, p.107) ou da presença muda dos vivos que escolheram descer (de forma voluntária ou não) em uma estação desconhecida no trem da minha vida — sou imensamente grata por aqueles breves momentos que um dia me couberam viver.

Consigo olhar para os seus sepulcros, ainda que porventura viventes, e recordar graciosamente do “silêncio sobre os rostos mais queridos” (GINZBURG, 2020, p.107).

Os meus sentimentos, pensamentos e experiências (de maneira oposta aos bens materiais) dão “alma” e “cor” à minha existência, eis que não podem ser surrupiados ou possuídos, mas tão somente apreciados (FROMM, 2014).

A bem da verdade, as nostálgicas lembranças (que podem ser provenientes de um recém transcorrido milésimo de segundo) encontrar-se-iam vivas, não no espaço físico em que me reuni com aquelas doces, amadas e inebriantes companhias, mas no respectivo momento em que pude estar ao lado destas.

Não importam os lugares, pois esta “massa de memórias e de sombras” (GINZBURG, 2020, p.23) habitam apenas o tempo.

Ademais, sabe-se que pela natureza singular do aludido tempo, o qual já foi absorvido pela nossa consciência, não poderá, como forma de garantia de uma felicidade futura, vir a sofrer qualquer tipo de restrição hipotecária.

A pouca tinta, entendo ser necessário apenas construir uma relação justa e sóbria com o capital, pois a verdadeira riqueza do ser humano consiste no desejo de sentir, saber, experimentar e ser.

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Bibliografia: FROMM, Erich. Ter ou Ser? 4º ed. Rio de Janeiro; LTC, 2014. GINZBURG, Natalia. As pequenas virtudes. 1ª ed. Trad. Maurício Santana Dias. São Paulo: Companhia das Letras, 2020.

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Sandra J.M. Villaverde é advogada criminalista e professora universitária no Rio de Janeiro – RJ.