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Pesquisa

O açúcar pode afetar seu humor e te deixar triste

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Autor/Imagem:
Pedro Nascimento, Edição

A ideia de um cupcake, habilmente coberto com cobertura de baunilha cremosa, pode colocar um sorriso no seu rosto, mas pesquisas sugerem que, a longo prazo, esse gosto por doces pode transformar aquele sorriso em uma cara triste – mas não pelas razões que você pensa.

Em um novo estudo, publicado na Scientific Reports, meus colegas e eu encontramos uma ligação entre uma dieta rica em açúcar e transtornos mentais comuns.

A Organização Mundial de Saúde recomenda que as pessoas reduzam a ingestão diária de açúcares adicionados (ou seja, todo o açúcar, excluindo o açúcar encontrado naturalmente em frutas, vegetais e leite) para menos de 5% de sua ingestão total de energia.

No entanto, as pessoas no Reino Unido consomem o dobro – nos EUA, o triplo – dessa quantidade de açúcar.

Três quartos desses açúcares adicionados vêm de alimentos doces e bebidas, como bolos e refrigerantes. O resto vem de outros alimentos processados, como o ketchup.

Ao mesmo tempo, uma em cada seis pessoas no mundo sofre de um transtorno mental comum, como um transtorno de humor ou ansiedade.

Poderia haver uma ligação entre o alto consumo de açúcar e transtornos mentais comuns?

Uma pesquisa anterior, publicada em 2002, examinou a ligação entre depressão e consumo de açúcar em seis países. Os pesquisadores, de Baylor College, nos EUA, descobriram que taxas mais altas de consumo de açúcar refinado estavam associadas a taxas mais altas de depressão.

Desde então, vários estudos investigaram a ligação entre o consumo de açúcar adicionado e a depressão subsequente.

Em 2011, pesquisadores espanhóis descobriram que, quando agrupavam participantes com base no consumo alimentos comercializados prontos, aqueles que comiam mais alimentos prontos tinham 38% de chance de desenvolver depressão em comparação com aqueles do grupo com o menor consumo.

A associação permaneceu mesmo após considerar a consciência de saúde e o status de emprego.

Em 2014, pesquisadores estudaram a associação entre bebidas adoçadas em um grande grupo norte-americano. Eles descobriram que as bebidas açucaradas e adoçadas artificialmente (bebidas dietéticas) poderiam aumentar o risco de uma pessoa desenvolver depressão.

E, mais recentemente, um estudo de 2015, incluindo quase 70.000 mulheres, descobriu maiores chances de depressão naquelas com alto consumo de açúcar, mas não naquelas com alto consumo de açúcares naturais, como os encontrados nas frutas.

Ainda não temos certeza do que causa a depressão, mas alguns pesquisadores acreditam que as mudanças biológicas estão na raiz do problema. Algumas dessas mudanças podem ser influenciadas pelo açúcar e sabor doce.

Por exemplo, um estudo em ratos descobriu que dietas ricas em açúcar e gordura podem reduzir uma proteína chamada Fator Neurotrófico Derivado do Cérebro (BDNF, do inglês Brain-derived neurotrophic factor) que influencia o crescimento e o desenvolvimento de células nervosas no cérebro.

Acredita-se que esta proteína esteja envolvida no desenvolvimento de depressão e ansiedade.

Outra possível causa biológica é a inflamação. Dietas ricas em açúcar podem aumentar a inflamação – uma reação protetora do corpo, normalmente direcionada contra microrganismos ou substâncias estranhas.

Enquanto sinais comuns de inflamação, como vermelhidão, estão longe de um transtorno de humor, os sintomas que nos mantêm na cama com um resfriado são muito mais próximos, como baixa energia e incapacidade de concentração.

Uma pesquisa em andamento sugere que os transtornos de humor podem estar relacionados à inflamação, pelo menos em alguns casos.

A dopamina é outro possível culpado. Um estudo usando ratos ganhou manchetes por sugerir que alimentos doces podem ser tão viciantes quanto a cocaína. Isto pode ser devido a efeitos sobre a dopamina, um químico cerebral envolvido no sistema de recompensa.

A dopamina também é conhecida por influenciar o humor. E o vício por si só está associado a um risco maior de desenvolver um transtorno do humor.

Finalmente, a ingestão de açúcar pode estar associada a outros fatores, como a obesidade, que por sua vez está relacionada ao humor.

Mas essas associações também podem refletir um fenômeno inverso: o mau humor pode fazer as pessoas mudarem sua dieta. Alimentos doces podem ser usados para aliviar sentimentos ruins, proporcionando um impulso de humor de curto prazo.

E o mau humor e a ansiedade podem fazer com que tarefas simples, como fazer compras ou cozinhar, sejam tão difíceis e exaustivas para o doente, que eles possam começar a evitá-las.

Então, eles podem optar por junk food, delivery e refeições prontas – todas as quais possuem um alto teor de açúcar.

Em nosso estudo mais recente, meus colegas e eu testamos a ideia de associação inversa. Usamos a ingestão de açúcar de alimentos doces e bebidas para prever novos e recorrentes transtornos de humor em um grupo de funcionários públicos britânicos.

Também investigamos se ter um transtorno de humor tornaria as pessoas mais propensas a escolher alimentos e bebidas doces.

Descobrimos que homens sem um transtorno de humor que consumiram mais de 67g de açúcar tiveram um aumento de 23% no risco de sofrer de um transtorno de humor cinco anos depois, em comparação com aqueles que comiam menos de 40g.

Este efeito foi independente do status socioeconômico dos homens, atividade física, bebida, tabagismo, outros hábitos alimentares, gordura corporal e saúde física.

Também descobrimos que homens e mulheres com transtornos de humor e alta ingestão de açúcar a partir de alimentos e bebidas doces tinham maior risco de se tornarem deprimidos novamente após cinco anos, em comparação com aqueles que consumiram menos açúcar.

Mas essa associação foi parcialmente explicada por suas dietas em geral.

Não encontramos evidências de um potencial efeito reverso: os participantes não alteraram a ingestão de açúcar após sofrerem de transtornos de humor.

Apesar de nossas descobertas, permanecem algumas questões sobre se o açúcar nos deixa tristes, se afeta mais os homens do que as mulheres, e se é a doçura, em vez do açúcar, que explica as associações observadas.

O que é certo, porém, é que o açúcar está associado a uma série de problemas de saúde, incluindo cárie, diabetes tipo 2 e obesidade.

Então, reduzir o açúcar é provavelmente uma boa ideia, independentemente de causar distúrbios de humor ou não.

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