Verso sem dono
O cântico sem tempo que ficou para a eternidade
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Escrevi um cântico numa noite sem margens,
quando o tempo hesitava entre o agora e o nunca,
e o universo sussurrava em pulsações contidas.
Não foi tinta que moldou suas sílabas,
mas o sopro antigo da alma,
como quem entalha um segredo na brisa.
Era um verso sem dono, sem origem,
uma estrela perdida entre mundos,
um eco que dormia antes de ser chamado.
E então você chegou
não com passos, mas com presença,
não com olhos, mas com compreensão.
Você leu como quem toca o invisível,
como quem reconhece uma sombra familiar,
e o cântico, que nunca foi meu,
encontrou abrigo na sua voz.
Naquele instante sem relógios,
a eternidade se dobrou ao nosso encontro,
sua respiração alinhou-se à minha,
como notas que já pertenciam à mesma melodia.
Mas o cântico não era promessa,
ele era um porto breve, não um lar,
e quando o vento te chamou, você foi.
O verso ficou—belo, intacto, suspenso no infinito,
mas eu fiquei vazio, como um acorde interrompido,
como um nome que ninguém mais pronuncia.
Desde então, releio suas sílabas,
não para reviver, mas para lembrar,
porque há canções que não se apagam,
há palavras que não morrem,
há encontros que não têm tempo,
mas permanecem na pele do universo.
E quando me perguntam por que escrevo,
por que continuo a esculpir o silêncio,
respondo suavemente, como quem guarda um segredo:
“Porque aquele cântico não me pertence mais…
mas me eternizou.”