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Estilos e gostos

O “EU” venceu

Publicado

Autor/Imagem:
Mércia Souza - Foto Francisco Filipino

Quase todos os meus trabalhos envolvem vendas e eu amo esse contato com as pessoas.

Uma segunda-feira normal, tranquila e, como de costume, movimento tranquilo por ser segunda. Uma mulher de meia idade entra na loja ao lado, há uma porta aberta entre as lojas como se fosse um único ambiente.

A cliente me parece apenas uma curiosa, olha peça por peça e não vejo nela nenhum interesse, me mantenho de costas, observando-a vez ou outra de relance. O tempo passa, ela enrola o tempo, observa desinteressada cada peça e por fim atravessa para a loja que estou com o mesmo ar de quem mata o tempo, como dizia meu avô.

Nesse momento ela me olha, recua de volta até o balcão de bio joias. Me aproximo. Ela me olha de cima abaixo, novamente, mostra a cicatriz no braço e me diz que quer pulseiras para cobrir a cicatriz, explica o que é, da alguns detalhes e partimos em busca de um conjunto de pulseiras para cobrir a cicatriz.

Experiente, percebo que é uma mulher discreta, prefere tons neutros e seleciono de acordo com a sua busca inúmeras pulseiras em tons marrons, bege, caramelo. Vamos formando um belo kit.

Ela me olha, olha para a vitrine e pede uma pulseira em tons roxo e verde. Pego, coloco no braço dela em meio aos vários tons de marrom. Acho lindo.

Ela vira de um lado para o outro, olha e diz:

_ Não combinou, coloque aquela outra.

Outro tom de marrom.

_ Eu achei lindo a mistura de cor. Penso.

Ela me olha, pede para eu retirar uma em tom bege, escolhe outra muito colorida, coloca, olha… e olha, e retira, não combinou. Passamos mais de vinte minutos nessa prova de pulseiras.

A cada vez que ela pede para eu pegar uma colorida, faço. Mas, mostro também outras opções neutras.

Ela parte então para a escolha de alguns colares e brincos. A cada tentativa de escolha, ela me olha de cima abaixo e repete.

_ Eu queria algo como a sua pulseira ou um colar tipo o seu.

Mostro. Ela escolhe um colorido e escolhe um neutro.

Quase no fim de tantos experimentos, ela me olha novamente, após passar todo aquele tempo dizendo:

_ Queria um colar como o seu…, mas não tem uma pulseira como a sua?

Tem, as coloridas. Não combinou. Dizia.

Ela me pede um último colar, colorido. Coloca, vai até o espelho e eu espero com algumas opções lindas e discretas.

Ela olha.

_ Não combina.

Volta até onde estou com o colar em mãos e diz:

_ Não precisa combinar, você não está combinando nada.

Rio, sou colorida, mas não digo nada. Fecho uma bela venda.

Dias depois tomando um drinque na companhia de uma amiga maravilhosa, conto a história.

Minha amiga retruca chateada.

_ Nossa, que falta de sensibilidade, grossa na verdade. Como você não está combinando? Você combina tons, cores, e eu acho lindo, só não sei usar.

Rio novamente.

_ Nem ela, acho uma forma de elogio sincero, ela achou bonito meu jeito de me arrumar, mas esse é o meu jeito e, por mais encantador que tenha sido, prevaleceu quem ela é, o “EU” interior dela venceu e ela saiu com o que gosta, e eu fico feliz por isso.

_ Mas não podia te elogiar e comprar o que ela gosta? Simples. Insiste minha amiga.

Às vezes não sabemos o que gostamos, se conhecer é um processo. Pensei, mas achei melhor dar o assunto como finalizado.

……………………………

“Apaixonada pela vida em todas as suas formas! Mãe, avó, artesã do crochê e escritora por vocação. Encontro inspiração na natureza e tranquilidade nas trilhas da montanha. Palavras e linhas são minhas ferramentas para criar e compartilhar amor.”
Autora de três livros publicados, colunista e integrante de uma comunidade literária.
Atualmente reside em Cachoeiro de Itapemirim-ES.

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