Um adeus, talvez
‘O que fui e o que continuo a ser marcam o silêncio da própria voz’
Publicado
em
Hoje, minhas mãos tremem sobre o papel,
como quem carrega o peso de ciclos que se fecham,
como quem compreende que o fim
não é uma ruptura, mas uma transição.
A tinta hesita enquanto nasce,
não por medo, mas por reverência.
Cada palavra escrita é um ato de entrega,
uma conversa íntima com o silêncio,
uma tentativa de traduzir o infinito.
Há silêncios que possuem mais vida que a própria voz,
e este é um deles —
uma pausa entre o que fui e o que continuo a ser,
um espaço onde o tempo se curva para ouvir.
Não há promessas neste adeus,
não há reticências, nem garantias.
Há apenas a certeza de que tudo
é um fragmento do todo,
e que terminar é também perpetuar.
Talvez alguém encontre estas páginas no futuro,
as leia não como histórias, mas como reflexos,
e nelas veja um lampejo do que fui:
uma alma buscando abrigo na eternidade das palavras.
Porque despedir-se não é um ato de perda,
mas um reencontro com aquilo que permanece.
Este é meu último verso, minha última verdade,
não como fim, mas como testemunho.
As palavras flutuam no papel como memórias,
vivas em sua impermanência,
amplas em sua simplicidade.
Cada linha carrega em si uma questão:
o que é o tempo senão a soma do que deixamos?
Minhas mãos, marcadas por histórias,
se tornam espelhos do que nunca se completa.
Promessas esquecidas, cartas não enviadas,
sonhos que repousaram na margem da realidade —
tudo isso habita os espaços entre as rimas.
Agora, o papel se transforma em um oceano tranquilo,
uma superfície onde despejo meu ser,
não como fuga, mas como revelação.
Cada palavra é uma onda que avança,
tocando a eternidade antes de se dissipar.
Fecho o caderno com serenidade,
não como quem abandona,
mas como quem aceita.
Minha sombra se alonga no chão frio,
e na quietude da noite,
ouço o murmúrio do universo que me envolve.
Porque o adeus nunca é o fim,
mas o início de tudo o que o tempo,
em sua infinita sabedoria,
decide carregar.