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Veterinário a pé

Ônibus interrompe cirurgia e vaca fica com um chifre

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Autor/Imagem:
Eduardo Martínez - Foto Reprodução

Para aqueles que não sabem, fiz medicina veterinária na Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro, conhecida nacionalmente simplesmente como Rural. Foi lá que conheci um dos meus melhores amigos, o Leo. Mas esta história aconteceu comigo e outro colega, o Almeidinha, que fazia matemática lá na Rural, cuja mãe ainda hoje possui uma fazenda em Piraí, município do Rio de Janeiro.

Éramos estudantes ainda, o Almeidinha veio me perguntar se eu sabia fazer descorna. Descorna, para aqueles que não sabem, é retirar os cornos de bovinos, caprinos e ovinos. Popularmente, as pessoas falam tirar os chifres. Mas, tecnicamente, os bovinos não possuem chifres, mas cornos.

Não vou tomar o seu tempo tentando explicar a diferença, mesmo porque este não é um artigo científico, mas apenas uma história curiosa que aconteceu nos meus tempos de estudante. Por isso, aqui vou falar chifre mesmo.

Pois bem, lá estávamos o Almeidinha e eu conversando a respeito de descorna, pois havia uma vaca na fazenda que estava com um dos chifres quebrado. Eu disse que não sabia fazer, mas que isso talvez não fosse difícil, pois poderia pesquisar nos livros na biblioteca. Fui até lá quase na mesma hora e descobri como fazer a tal cirurgia.

Comprei os materiais e medicamentos necessários no dia seguinte. Marcamos para fazer a retirada dos chifres da tal vaca no domingo pela manhã. Pegamos o ônibus para Piraí bem cedinho, chegamos à pequena cidade, onde tomamos outro coletivo, que passava em frente à porteira da fazenda.

Mal entramos na propriedade, fomos até a sede, onde tomamos café. Em seguida, rumamos para o curral, onde a nossa paciente já nos esperava em jejum. O chifre bom apontado para o céu; o ruim, pendurado, parecia o pêndulo de um relógio de parede. Ela era marrom e, como a maioria dos animais da fazenda, não tinha nome.

O Almeidinha, habilidoso com o laço, a conteve para que eu pudesse aplicar a dose do potente tranquilizante na jugular. Aqueles 400 quilos tombaram quase que instantaneamente. Eu sabia que isso iria acontecer, haja vista as aulas sobre o assunto. No entanto, quando se vê isso acontecer pela primeira vez é uma surpresa. Funciona mesmo!

Apliquei o anestésico local ao redor do chifre para a vaca sem nome não sentir dor. Fiz a cirurgia de forma até relativamente tranquila. Os pontos ficaram bem legais, apesar da falta de experiência.

Estava me preparando para começar a retirar o chifre bom, quando o Almeidinha avistou o ônibus vindo lá no horizonte. Ele disse: “O próximo vem daqui a quatro horas ou mais”. Olhei para ele, não trocamos nenhuma palavra. Juntamos as coisas rapidinho e corremos que nem loucos para a porteira da fazenda. A vaca sem nome ficou lá.

Depois de muitos anos, encontrei a mãe do Almeidinha, que me perguntou: “Quando é que você vai de novo lá na fazenda tirar o outro chifre da vaca?”

Leia na quinta, 14, O triste fim da vaca

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