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Valores duvidosos

Para uma geração frustrada, só o colo de Bolsonaro como alento

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Autor/Imagem:
Wenceslau Araújo - Foto de Arquivo

Atendendo recomendações do meu pediatra, passei a evitar certos produtos, entre eles o Vick Vaporub, o Merthiolate, Leite de Rosas, a pomada Minâncora, os sabonetes Phebo e Cashmere Bouquet e as colônias Tabu, Alfazema e Countoré. A razão do pedido é impedir que as viroses que permeiam o mundo moderno me reconheçam pelo cheiro como homem de idade acima da média. Embora o aroma seja de poesia (tudo a ver com o poema de Adélia Prado), decidi acatar a ordem médica porque, após contar os anos, percebi que tenho menos tempo para viver a partir daqui do que o que eu vivi até agora. Aliás, o que fazer no Brasil em que deputados, senadores, delegados e até desembargadores cometem crimes.

É o tempo mostrando que passei da hora de debater estatutos, regras, procedimentos e regulamentos internos, sabendo que nenhum deles será alcançado. Normas não servem mais para quem sobreviveu à gripe espanhola, ao Coronavírus, à vitrola de gramofone, às cartas manuscritas e ao bolsonarismo. Depois de andar, pedalar, andar de trem, dirigir Fusca e trabalhar em subsolo, estou com minha calça boca de sino aguardando o Elon Musk SpaceX para Marte. Não fosse a bosta de Congresso que elegemos, estaria certo de que a vida de hoje é maravilhosa. Não estou.

Apesar da bandidagem engravatada, para quem andou de bonde, lotação e Fusca como táxi, morro de inveja da juventude triste de nossos dias. Embora a garotada disponha do que nunca dispus, é uma geração que se estressa e se frustra por quase tudo. Os jovens dessas duas últimas décadas andam de carro próprio ou de Uber, têm cartão de crédito, não lavam cuecas nem calcinhas, estudam em escolas particulares, viajam com alguma frequência para a Disney, vira e mexe estão em baladas pouco republicanas, mas aproveitam muito pouco tudo que recebem. Por exemplo, a internet e as redes sociais. Usam, mas não buscam conhecimento. Pior é votar sem consciência em plena evolução eleitoral.

Religiosidade? Só quando o calo aperta. Dificilmente se encantam com decorações natalinas, tampouco com um ipê florido no meio da avenida. Amam amar Anitta, Ludmilla, Jão, Lexa, João Gomes, É o Tchan e porcarias afins, mas odeiam amar Belchior, Fagner, Caetano, Gil, Lenine, Tim, Benjor, Milton, Bethânia, Chico e outras feras da MPB. Reivindicam direitos de expressão e não oferecem nada em troca. Nenhuma atitude. Julgam, mas reclamam quando são julgados. Na maioria das vezes, se acham vítimas dos pais, aos quais rotulam de juízes duros e impiedosos. É claro que nunca experimentaram as dores da palmatória ou o castigo sobre grãos de milho ou de feijão. Provavelmente nunca votaram em urna de papel, aquela que Bolsonaro jamais questionou. E sabem por quê? Descubram!

De compaixão e valores duvidosos, choram e ameaçam vingança pública pelo cachorro maltratado, mas silenciosamente desejam que o homem seja esquartejado. Sempre querem um pouco disso e muito daquilo. Para os novos patriotas, direitos são obrigação. Já os deveres não passam de invenção dos opressores. Querem pai e mãe 24 horas à disposição, mas dificilmente aparecem quando um deles têm necessidade. Ou seja, não conhecem o idioma da reciprocidade. E haja insatisfação, infelicidade, descontentamento, adoecimento e falsos soluços.

Desnecessário debater as razões, mas trata-se de uma geração inconformada. Às vezes, mal-amada. Nada de anormal para quem denomina um déspota de mito e seus seguidores de democratas. Presa em suas desculpas, acomodada em suas gaiolas de ouro, a meninada de hoje, com destaque para a patriotada, posta sorrisos e beijos prolongados em praias paradisíacas, mas não se banham no mar curador. Limpam o lixo na praia com os amigos, mas não arrumam a própria cama. Em casa, estampam tristeza, sofrimento, dor… a dor de ter que crescer sem fazer por onde… merecer. Querem moleza, procurem alento no colo do Jair Bolsonaro. Simples assim.

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Wenceslau Araújo é Editor-Chefe de Notibras

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