Cada um no seu quadrado
Poderes precisam levar mais a sério a teoria de Montesquieu
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Eu não sou especialista no assunto, já aviso logo de início. Minha formação não é em relações internacionais, nem em ciência política, nem em sociologia, nem em coisa parecida. Aliás, se você abrir meu currículo, talvez encontre umas disciplinas eletivas que fiz por curiosidade (e por falta de vaga nas obrigatórias), mas nada que me autorize a subir num palanque acadêmico. O que eu sou, no máximo, é uma curiosa profissional. Daquelas que abrem abas e mais abas no navegador porque clicaram num artigo e acabaram caindo em uma discussão sobre o sistema de freios e contrapesos de Montesquieu às duas da manhã.
Pois bem. Foi assim que, sem querer querendo, comecei a ler sobre essa tal teoria que é considerada uma das bases das democracias modernas. Montesquieu, lá no século XVIII, já dizia que, pra evitar abusos e proteger a liberdade do povo, era preciso dividir o poder em três: Executivo, Legislativo e Judiciário. Cada um com seu papel, mas todos vigiando uns aos outros, como um grupo de irmãos que, embora briguem o tempo todo, se equilibram.
A teoria parece simples, mas a prática, ah, essa é outra história. Outro dia, ouvi alguém dizendo que o Supremo Tribunal Federal — ou mesmo um de seus ministros — estaria se excedendo, ultrapassando os limites da sua competência. A crítica era de que o Judiciário estaria interferindo em decisões que deveriam caber ao Legislativo ou ao Executivo.
Mas aí é que está o ponto interessante: até isso, pasmem, está previsto no tal sistema de freios e contrapesos. Montesquieu não era bobo. Ele sabia que o poder tende a crescer, a querer mais espaço, a se empolgar — e que, quando um dos poderes se exalta, cabe aos outros conter o ímpeto. Foi o que aconteceu, por exemplo, quando o Executivo resolveu brincar de golpe de Estado. Nessa hora, não tem como o Judiciário se manter sentado na sua poltrona de veludo institucional apenas assistindo. É esperado, até desejável, que haja reação — proporcional, firme, constitucional.
Claro, tudo isso pode ser debatido, revisto, criticado. Democracia é isso mesmo: um processo contínuo de tensões, ajustes, avanços e retrocessos. Mas o que não dá é pra confundir defesa da democracia com autoritarismo de toga, só porque o Judiciário agiu quando os outros poderes ameaçaram cruzar a linha.
No fim das contas, penso que, mesmo sem diploma na área, posso opinar um tiquinho. Afinal, a cidadania também exige curiosidade e um pouco de desconfiança saudável de quem acha que pode tudo.