Virou filme
Quilombola do Nordeste resgata as memórias e a história de Onze Negra
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Na tela grande, luzes dançam como vaga-lumes de outras eras. O som do tambor ecoa pelos cantos da sala escura, como se o tempo fosse uma fita rebobinada. E lá está ele, o Quilombola. Não um personagem qualquer, mas um espírito de luta, um guardião da memória, uma sombra viva que atravessa os séculos.
“Onze Negra” — não é apenas um nome. É um suspiro ancestral, uma vila escondida no coração da resistência. Lá, onde o sol nasce com mais orgulho, a história não é contada em páginas, mas em passos de dança, bordados na saia rodada das mestras do saber. Cada criança que corre pelo terreiro carrega um pedaço de passado nos olhos. Cada ancião, com as mãos marcadas de tempo, guarda histórias que não couberam nos livros de História.
O cinema, por um instante, faz justiça. Dá cor ao que quiseram apagar, dá voz a quem por tanto tempo foi silenciado. E ali, no escuro da sala, a plateia se depara com um espelho que não mente. O Quilombola aparece de peito erguido, com a força da mata e a fé do axé. Sua fala corta como faca e acaricia como reza. Ele não é só o protagonista — é o próprio roteiro reescrito com sangue, suor e samba.
É curioso ver como o cinema, ferramenta de sonhos, virou também território de memória. Onze Negra não é uma invenção do roteiro, mas uma realidade viva, pulsante, que sobreviveu a séculos de esquecimento imposto. É quilombo, é lar, é luta que virou imagem.
Recebê-la é mais que assistir — é se permitir sentir, lembrar, honrar. E ao final do filme, quando as luzes se acendem e os créditos rolam, não é raro ver olhos marejados. Não de tristeza, mas de pertencimento. Porque, no fundo, todos carregamos um pouco de Quilombola dentro de nós: a vontade de resistir, a coragem de lembrar e o direito de contar nossa própria história.