Curta nossa página


Padroeira da cidade

Recife fecha as portas e abre o coração para Nossa Senhora do Carmo

Publicado

Autor/Imagem:
Paulus Bakokebas - Foto de Arquivo

Há dias em que o tempo desacelera, e o coração da cidade bate num compasso mais antigo. Nesta quarta-feira, 16, Recife para. Mas não por protesto, nem por engarrafamento. Para por devoção. Pela fé que atravessa séculos, sobrevive a modismos, políticas e esquecimentos. Para para seguir, com olhos úmidos e pés no chão, a imagem de Nossa Senhora do Carmo, padroeira da cidade, rainha dos céus e guardiã das esquinas do coração nordestino.

Desde as primeiras luzes da manhã, a cidade já anunciava: é dia santo, é dia grande. O cheiro de incenso misturava-se ao das flores frescas que enfeitavam altares improvisados em janelas, calçadas e praças. Sinos repicavam, não como eco antigo, mas como chamado presente: “Vinde, ó fiéis! A Mãe caminha entre nós.”

A procissão, centenária como os sobrados do Recife Antigo, vai sair imponente da Basílica do Carmo, aquela mesma que há quase três séculos testemunha promessas e milagres. Levada nos ombros dos devotos, a santa parecerá flutuar. Olhos cerrados, mãos postas, vestes alvas que tremulam com o vento das ladainhas. Gente de todo canto: criança no colo, idosos de joelhos, comerciantes que fecham as portas por algumas horas para abrir o coração.

E ali, entre passos lentos e orações murmuradas, estarão também as dores da cidade — as que a fé suaviza. Cada vela acesa dirá mais do que palavras: gratidão, saudade, esperança. Um Recife que, apesar de moderno e ligeiro, ainda se ajoelha diante daquilo que não se explica, apenas se sente.

A procissão avançará, e atrás dela estará a alma da cidade. Pode até haver o batuque do maracatu silenciado, a poesia de Capiba sussurrada, o povo em silêncio respeitoso. Até o céu, cinzento de julho, deve segurar a chuva em respeito.

Quando a imagem voltar ao altar, já ao entardecer, o Recife vai respirar fundo. O dia passará diferente. Mais leve. Mais crente. E enquanto a multidão se dispersar, restará no ar a certeza de que, mais do que padroeira, Nossa Senhora do Carmo é a mãe que faz a cidade lembrar de si mesma — de sua fé, de sua história, de seu povo.

Publicidade
Publicidade

Copyright ® 1999-2025 Notibras. Nosso conteúdo jornalístico é complementado pelos serviços da Agência Brasil, Agência Brasília, Agência Distrital, Agência UnB, assessorias de imprensa e colaboradores independentes.