Passado, presente e futuro
Réveillon de Drácon com pão, passa e gesso pode mudar os rumos de 2026
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Um novo ano está prestes a começar. Nos gabinetes refrigerados do Eixo Monumental, ninguém fala em recesso, muito menos em férias. O clima é outro; de planilha, consulta jurídica e frases interrompidas no meio. A virada de 2025 para 2026 será discreta, quase protocolar. O cenário foi montado para um Réveillon de Drácon com direito a pão seco à mesa – não necessariamente respeitado o Direito -, com passas contadas uma a uma e a legislação eleitoral aberta na página certa.
Nos bastidores comenta-se que a austeridade não é voluntária, mas calculada. Os passos, lentos, devem evitar novos tropeços para que membros não fiquem paralisados, diante do caos na saúde que não tem emenda. O assunto dominante é como chegar a outubro sem fraturas. A palavra de ordem, portanto, é evitar ruído. Nada de gastos e gestos largos ou discursos inflamados demais. Ninguém deseja que interpretações silenciosas transformem intenções supostamente boas em peça de acusação.
Ainda antes de o ano acabar, advogados eleitorais viraram presença fixa em reuniões destinadas anteriormente apenas a políticos. Agora qualquer ideia precisa passar pelo filtro da legalidade preventiva. Pode postar? Pode discursar? Pode aparecer? Pode entregar? O verbo “poder” nunca tem sido tão conjugado. E, em paralelo, cresce o temor de que improbidade administrativa volte a ser manchete, como um desastre previamente anunciado.
No campo político a comparação com Drácon não é gratuita. A legislação existe, mas o peso da caneta depende do contexto. Um gesto idêntico pode ser irrelevante para uns e fatal para outros. Por isso, o cuidado com o pão — o essencial — e com as passas — os detalhes aparentemente inofensivos que, acumulados, formam um banquete probatório indigesto. E com a saúde minguando, quem não tem plano será obrigado e engolir goela a baixo.
No mesmo palco observa-se também o jogo duplo. Enquanto uns seguram as mãos, outros testam os limites. Eventos “institucionais” ganham tom emocional. Discursos técnicos vêm temperados com frases que aquecem a base. Não se pede voto, mas se constrói narrativa para amanhã. Candidaturas são lançadas de catapultas para marcar território. Tudo dentro da zona cinzenta, onde a lei observa em silêncio e o Ministério Público toma notas.
Como se trata de ano eleitoral, o consenso é simples e cruel. Excepcionalmente, 2026 começará antes do carnaval. Erros do passado podem expurgar muita gente do tabuleiro. Grupos poderosos estão atentos. Quem exagerar na euforia do Réveillon pode acordar com uma representação na porta. E quem confundir visibilidade com licença para rodar a baiana corre o risco de transformar capital político em passivo jurídico.
Em Brasília, o Réveillon de Drácon não será de celebração, mas sobre o que fazer para sobreviver. Um ano em que o pão precisa ser repartido com recibo, as passas contadas com lupa e o brinde feito em voz baixa, em piso antiderrapante, porque, reitere-se, não há Samu para socorrer. O foguetório da virada não decidirá o futuro. A caixinha, quando aberta de novo, mostrará o que ficou registrado depois que a festa acabou.
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José Seabra é CEO fundador de Notibras.
