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Tom da lei

Ruas sem esquina marcam o carnaval do brasiliense

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José Daldegan* - Foto Lázaro Mendes

Brasília é uma cidade única no mundo e pode nos ajudar a encontrar soluções criativas, evitando falsas e efêmeras alternativas ou explícitas e pontuais concessões fora da lei.

As leis são, em geral, fruto de um consenso de urbanidade. Neste caso, devem ser respeitadas e preservadas. As leis de trânsito são um exemplo deste consenso de urbanidade.

Soluções verdadeiramente criativas são aquelas capazes de resolver problemas sem flexibilizações ou degenerações da lei, como encontrar a palavra certa para o verso de uma música: com significado, cadência, métrica e rima.

O Plano Urbanístico de Lucio Costa, como uma obra de arte, ainda tem muito a nos ensinar. Foi concebido para que seus habitantes tenham ao seu alcance todos os bens e serviços de primeira necessidade.

Qualquer morador do Plano Piloto pode, num raio de 500 metros, alcançar tudo o que precisa diariamente, ou seja, não precisa de uma condução no dia a dia – exceto para trabalhar (o que tende a diminuir por causa do avanço do teletrabalho). Outros serviços mais complexos, como unidades médico-hospitalares, estão num raio máximo de 3 km de qualquer habitação. Portanto, também muito próximos.

O Carnaval em área residencial deve seguir a mesma lógica. Há que se valorizar e dar espaço às iniciativas locais, comunitárias.

Pela experiência das lideranças comunitárias do Plano Piloto, acumulada nos últimos 25 anos, pode-se dizer que o Carnaval em área residencial deve atender a 10 parâmetros:

1- verificar a receptividade da comunidade local, pois há casos graves de saúde ou particularidades que devem ser respeitados;

2- quantitativo entre 500 a 2 mil foliões (dependendo do local e situação);

3- fora do interior das quadras, onde não precise obstruir o trânsito dos moradores, da SAMU ou outros serviços;

4- temas e marchas tradicionais, valorizando a cultura;

5- sem permanecer fixo num mesmo lugar, mas desfilando de passagem;

6- sem o uso de trio elétrico ou qualquer forma de amplificação de som;

7- sem convocação de foliões pela mídia, para dar preferência aos moradores e não gerar imprevisibilidade do número de foliões ou atrair grande afluxo de carros;

8- sem interesses comerciais, pois invariavelmente acabam privilegiando a quantidade e não a qualidade;

9- duração limitada e à luz do dia;

10- respeito às leis.

Carnaval com estes parâmetros dificilmente será causa de sérios transtornos. Um exemplo clássico é o Pacotão, que nunca gerou qualquer tipo de reclamação aos líderes comunitários.

Carnaval respeitando esses parâmetros será sempre contagiante e admirado.

Seguindo o espírito urbanístico brasiliense, o Carnaval em área residencial deve ser descentralizado, espontâneo, livre, sem se prender a um único local, a um único público, a um único nome.

Os médios, grandes e megablocos carnavalescos, com verbas públicas e patrocínio privado, já têm seu local definido pela preferência dos próprios foliões, que comparecem em massa nos espaços abertos do Eixo Monumental, nos Setores Comerciais e Bancários Sul e Norte, no Parque da Cidade, no Estádio Mané Garrincha.

Sucesso ao Carnaval comunitário, tipicamente brasiliense, ao alcance de todos e respeitando as minorias – ainda que essa minoria seja apenas um único morador especialmente doente, que precise de paz e que não tenha chance de buscar outra alternativa.

*Engenheiro, ex-presidente do Conselho Comunitário da Asa Sul

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