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Tá chegando a hora

Sucessão em Brasília tem Leoa aguerrida e balaio de gatos se atracando

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Autor/Imagem:
Marta Nobre - Foto de Arquivo

A quase definida decisão de Ibaneis Rocha em disputar uma cadeira no Senado no próximo ano, abre a corrida sucessória ao Palácio do Buriti. Há, como disse o próprio governador, um nome da sua preferência para sucedê-lo. Mas surgiu, a partir daí, um balaio de gatos onde até o rabo da esperança já foi mordido. Começa, assim, o desenrolar de um novelo que promete fazer ecoar um urro leonino na vastidão do Cerrado.

A estrela da vez, ou melhor, a fera da vez, é a Leoa Aguerrida, que ruge para seus adversários. Com olhar de quem já devorou nas urnas muitos candidatos, ela surge em pesquisas informais como aquela que tem dentes suficientes para morder o segundo turno. Os desafetos, claro, tentam dizer que é só uma gata em pele de onça, mas todo mundo sabe que quando ela avança, todos somem de vista.

Do outro lado, o já tradicional Tucano de Asa Cortada cisca entre os escombros da sua própria biografia. Um dia voou alto, pousou em eventos com nome em inglês e discurso técnico; hoje, arrasta pena nas redes sociais, tentando lembrar ao eleitor que ele já existiu. Ninguém tem coragem de avisá-lo que Brasília não perdoa ave que vira pombo.

Mais abaixo na cadeia eleitoral, temos o Patureba que Não Alça Voo, criatura folclórica que aparece a cada eleição prometendo “renovação com experiência” — ou seja, nem jovem o bastante para empolgar, nem velho o bastante para merecer respeito. Seu comitê, com uma estrela na porta, parece uma reunião de condomínio, onde há muita indignação e nenhum plano.

E tem mais um, o mais pitoresco dos postulantes: o Homem do Patrimônio Artístico, que um dia cuidou da cultura como quem restaura azulejo português. Agora, virou peça de acervo — mofado, esquecido e citado apenas quando alguém quer lembrar “como as coisas eram melhores”. Seu jingle ainda toca nas rádios comunitárias, mas só porque o DJ esqueceu de trocar a playlist.

Nos bastidores, os articuladores dizem que “o jogo está aberto”, expressão que, em Brasília, significa que ninguém tem a menor ideia do que está acontecendo, mas todos já compraram ternos novos. A velha raposa do Entorno, sempre de terno claro e sorriso sorrateiro, resume: “Essa eleição vai ser decidida no urro, na pauta do dia e no WhatsApp da tia Paulinha, uma aliada de última hora”.

Enquanto isso, o povo — aquele ser mítico que habita filas de ônibus e grupos de bairro — assiste à prévia da eleição como se fosse mais uma reprise de novela que já viu, já conhece os personagens, e sabe que no final o favorito (no caso em questão, a favorita) se elege.

Dessa vez, garante os mais diferentes espectros políticos, a Leoa vai morder.

Além dos já conhecidos mamíferos eleitorais e aves de asas rotas, surge no cenário candango o inevitável Chupim de Plantão — aquele que não tem legenda, mas sempre arruma um ninho alheio para botar seu projeto pessoal de poder. Vive rondando os partidos médios, oferecendo “capilaridade”, o novo nome para “tenho uns votos no Gama e um primo na Codeplan”.

O Camaleão, por sua vez, é figurinha fácil nos palanques. Em 2010 era liberal, em 2014 era progressista, em 2018 virou patriota, e agora anda flertando com o agroespiritualismo popular. Diz que tem projeto para a cidade, mas ninguém sabe qual, porque muda de cor conforme a pesquisa qualitativa da semana. Ele é a prova viva de que a ideologia em Brasília é só uma sombra no sol de agosto.

Mas o mais temido pelos analistas é o Lobo em pele de Gestor, aquele que aparece nas entrevistas com powerpoint, fala em “choque de eficiência” e promete entregar resultados “como se fosse uma empresa”. Seu passado, no entanto, inclui um contrato suspeito com a limpeza urbana, três CPIs adormecidas e um MBA comprado na internet. Ainda assim, como fala com voz baixa e usa blazer cinza, muita gente acha que ele “tem perfil”.

Nos bastidores, os partidos fazem contas como quem tenta montar um quebra-cabeça com peças de outro jogo. Já se fala até em “candidatura convergente”, uma entidade mítica que supostamente uniria centro, direita e esquerda num só corpo — algo tão improvável quanto um tatu voador que dança forró no Setor Bancário Sul.

Enquanto isso, o eleitor segue sua rotina de trabalhar, reclamar do transporte, sonhar com as férias e voltar para casa com a certeza de que será novamente convocado a escolher entre o conhecido que vem fazendo e o novo que já vem vencido.

Brasília, esfinge de concreto e contracheque, observa tudo com seu céu seco, seus prédios sem esquina e sua vocação eterna para o surrealismo administrativo. Mas o dia D está chegando. E antes dele, vem o C. De Celina, com a garra de um L de leoa.

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Marta Nobre é Editora-Executiva de Notibras

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