Porto de Luz
TODO O AMOR
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em
“Risque outro fósforo, outra Lua, outra cor / E não tem mais nada negro amor”
(Bob Dylan)
Nas avenidas, o cara lembrava de coisas estranhas aos cortes; fragmentadas.
Perambulava pelas calçadas tropeçando em pedras imaginárias.
Foi andando aí pela vida até se esmolambar e cair no beco.
Anos de andanças e chuvas e coisas da rua.
Passado o transe levantou-se do chão.
Fez a barba e cortou oi cabelo.
Meteu uma roupa decente, de “bacana” lá das bandas dos Jardins e voltou à porta da casa.
Bateu a Campinha.
— Boa tarde. Eu sou o o cara.
— Que cara?
— O cara que voltou.
— Espera, vou chamar a patroa.
Anos antes, o cara perambulou pela vida e jamais pensou um dia em chegar àquela porta.
— Quem é você?
— O cara.
— Que cara?
— Aquele que te ama e nunca te esqueceu.
A mulher teve um peripaco.
“Não pode ser. Não. Ele já morreu. Não é possível”
— Oi, sou eu mesmo.
— Mas o que aconteceu?
— É o que eu vim aqui te perguntar.
Passado o estranhamento, os dois entraram e sentaram frente a frente:
— É você mesmo?
— Sim, sou eu.
— Por onde você andou?
— Por aí.
Dias depois os dois estavam cantando canções lindas e lembrando de histórias impossíveis de terem acontecido.
Passaram-se os anos e eles morreram juntos.
Abraçados.
O amor é mesmo uma maluquice.
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Gilberto Motta é escritor e apaixonado por histórias de amores improváveis. Vive na Guarda do Embaú SC.
Foto Jessica Denney/Porto de Luz