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Vergonha planetária

Vento sopra ao contrário e cerco e circo estão se fechando

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Autor/Imagem:
Wenceslau Araújo - Foto José Dias

A diferença de seis milhões de votos entre um e outro candidato no segundo turno consolidou o que a maioria dos brasileiros já sabia: o Brasil e o povo considerado desigual querem democracia, paz, liberdade e os mesmos direitos reservados para a elite conservadora e que se acha acima da concepção de coletividade. Originária do grego demokratia, a palavra democracia é composta pelos vocábulos demos (que significa povo) e Kratos (poder ou forma de governo). O conceito de ambos é garantir aos cidadãos o direito à participação política. Independentemente de um governo à direita ou à esquerda, uma sociedade democrática é aquela em que o poder é claramente repartido entre suas várias instituições executivas, legislativas e judiciárias. Certo? Apenas para uns. Para outros, a democracia significa tão somente o controle sobre os demais, principalmente quando estes (os demais) discordam das teses dominantes.

Esta é a famosa democracia de imitação, tal e qual a da Rússia de Vladimir Putin. No sistema do engodo e da mentira, quem tem esperança sabe que, a qualquer momento, coisas ruins podem acontecer. É o impossível que se torna possível. Denominados liberais conservadores, os antidemocratas de hoje estão mais para patriotas insossos e nacionalistas de araque. Eles apostaram que seria fácil destruir em um único mandato o que foi construído durante anos e graças ao suor e ao sangue de verdadeiros e preocupados brasileiros. Erraram feio. Erraram, mas não se entregaram. Dizem no rádio, na televisão e nas mesas retrógradas de botequim que o temor do conservadorismo é com a volta do comunismo. Perdão pelo sincericídio, mas isto é o mesmo que passar recibo de desinteligência política, de estupidez e de inaptidão agudas com o cotidiano brasileiro.

Tolice ainda maior é viver de inventar fake news para desestabilizar pessoas ou candidaturas antagônicas e provavelmente vitoriosas. Se o povo do cercadinho desconhece, vale a pena reavivar suas memórias com a força do trabalho dos nordestinos que avaliam como sub-raça. Eles podem não seguir as cartilhas do ódio, da divisão e do desamor, mas são os principais construtores da nação. Reitero que o comunismo como corrente política não cabe no Brasil de nossos dias. Na verdade, nunca coube. Nem mesmo João Goulart, Miguel Arraes e Leonel Brizola, considerados socialistas de carteirinha, pregavam a ideologia de Luiz Carlos Prestes e de Carlos Marighella. O mesmo ocorre com Lula da Silva. O que eles defendiam – e defendem – é o trabalhismo, proposta diametralmente oposta.

Além de materialista, internacionalista e defensor da abolição da propriedade privada, o pensamento comunista escraviza o homem ao Estado e prescreve o regime de garantia do trabalho. Fortemente nacionalista, o trabalhismo, ao contrário, é a dignificação do trabalho e não tolera a exploração do homem pelo Estado nem do homem pelo homem. Simples assim, embora de difícil compreensão para os que não conseguem enxergar além de um palmo do nariz. No jargão popular, ninguém é suficientemente competente para governar outra pessoa sem o seu consentimento, sem o seu voto. Enfim, a democracia é o governo do povo, pelo povo e para o povo. Por isso, novamente votarei pelo direito indistinto de minha autonomia política.

É uma luta diária contra aqueles com aptidões claras e rápidas para desenvolver habilidades extraordinárias em benefício pessoal. Ou seja, nada além de vantagens para o próprio bolso. São os patriotas que buscam liberdade para si mesmos, mas a negam para os outros. Como ser humano cristão e cheio de defeitos, não tenho – e não quero ter – méritos para julgar meus semelhantes. No entanto, exijo o direito – e o dever – de apontar eventuais falhas em suas propostas, projetos ou ações. Por essa razão, embora o clima de ódio não me favoreça, não há hipótese de me silenciar diante do descalabro em que se transformou o governo do presidente em exercício. Por mais que queira entender, é difícil concordar com a inversão generalizada dos valores estabelecidos pelo atual líder, cuja maioria dos liderados prefere seguir na contramão do que é determinado pelas quatro linhas.

O resultado é que, apesar do nacionalismo, da idolatria e do fanatismo, a globalização gera vergonha planetária. Para sorte do Brasil e de seu povo, nada é permanente. Enquanto o mundo gira, mudam-se as oportunidades, os sentimentos, os valores, os desejos e as opiniões. A vitória é sempre possível para aquele que se recusa a parar de lutar. Ninguém é melhor do que ninguém, mas alguns se destacam pelo caráter e outros pela ausência dele. Os ventos também mudam. Como o argumento anticomunista não prosperou, o vento passou a soprar para o outro lado. Por conta disso, o cerco e o circo estão se fechando. Deus pode até não mudar nossa situação, mas poderá usar a situação para nos mudar. Só evolui quem a cada dia vive um eterno recomeço. A hora é agora.

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