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O café e a avó

Vida, doce como é, não precisa de açúcar na xícara

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Autor/Imagem:
Eduardo Martínez - Foto João Alves de Matos.

A minha relação com o café não é de hoje, mas também não posso dizer que sempre foi apaixonada. Ainda me lembro quando a minha avó pegava a garrafa térmica e dava uma sutil chorada sobre a minha xícara repleta de leite. Ficava aquele tom marrom bem clarinho, o gosto era agradável ao meu paladar infantil, talvez por compartilhar mais esse momento ao lado daquela mulher tão encantadora aos meus olhos.

Já na adolescência, abandonei por completo o café. Não gostava nem daquelas balas com esse sabor. Aliás, não conseguia entender como é que alguém gostava daquilo. Não sei se é por causa da busca por novos caminhos ou, então, simplesmente por causa do turbilhão de hormônios. E foi assim por mais alguns anos, até que me tornei funcionário do Banco do Brasil, ali em Copacabana. Voltei a tomar café, um café ruim, mais doce que rapadura, provavelmente para fazer uma social com os colegas. Seja como for, deixei de ignorar esse hábito tão brasileiro.

Lá em casa, o pó durava um tempão. Pra falar a verdade, eu até sabia fazer, pois havia visto tantas e tantas vezes a minha avó preparando. Todavia, creio que não tinha feito uma vez sequer. Até que um dia, não sei por que carga d’água, cismei em preparar um pouco.

Lá fui eu atrás daqueles filtros de papel pelos armários da cozinha. Achei, mas a caixa estava mofada. Desci e fui ao mercado, quase em frente ao edifício onde morava, na rua Voluntários da Pátria, em Botafogo.

Procurei pelas prateleiras e, quando eu já estava indo em direção ao caixa, meus olhos se fixaram naqueles coadores de pano. A imagem da minha avó logo me veio à mente e quase joguei os tais filtros de papel pro alto. Obviamente, não fiz isso.

Peguei o coador de pano, que me encorajou a buscar pelo café mais adequado para aquela ocasião. Foi aí que percebi que a variação dos preços era enorme! Mesmo assim, escolhi a que mais me agradou, talvez influenciado pela bela imagem de grãos inteiros e torrados do rótulo.

Corri de volta, entrei na cozinha quase esbaforido. Coloquei a água para ferver, enquanto admirava aquele coador. Abri a embalagem do café e senti aquele aroma que tanto me lembrava a minha avó.

Momentos depois, lá estava eu na sacada, com uma xícara nas mãos, sentindo aquele quentinho inebriar meu coração. Sorvi um pouco do líquido preto, ao mesmo tempo em que meus olhos, saudosos, se fechavam. O café estava sem açúcar. Aliás, de doce já basta a vida!

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