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Biscoito de vento

Aníbal, viúvo, encontra o que comer por comer

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Autor/Imagem:
Eduardo Martínez - Foto Produção Irene Araújo

Anibal nunca havia sido alguém muito popular, do tipo falante e que todos gostam. Desde os seus tempos de criança, a timidez o acompanhou. Foi um adolescente levemente arredio. Não chegou a ser um rebelde, mesmo tendo vivido numa época de transformações culturais intensas.

Casou, já beirando os 30, com Magdalena, que preservou a virgindade até a noite de núpcias, decisão muito mais dele do que dela. Eram como meias diferentes calçadas pela mesma pessoa, não combinavam. Foram iludidos pelo dito popular que os opostos se atraem, se bem que não eram opostos, mas diferentes, simplesmente diferentes, como estampas de bolinhas e listras.

Após alguns anos, o casal passou a viver como muitos da época, ou seja, abraçado a aparências, infeliz, até que Magdalena começou a definhar, definhar e, então, seu frágil corpo não resistiu. Quando o hermético Anibal se viu viúvo, com os filhos já crescidos e encaminhados na vida, chamou o pai, também viúvo, para morar em seu apartamento de dois quartos. Silva aceitou, até porque sempre havia se dado muito bem com o primogênito.

Após, e somente após a morte da esposa, Anibal teve alguns relacionamentos com o sexo feminino. Chegou ao ponto de se sentir apaixonado por algumas mulheres. Mas paixões vêm e vão. E as de Anibal eram como biscoitos de vento, que se come e nem se sabe muito bem por que se continua comendo. Simplesmente se come. Até que enche!

Aqui vale contar uma dessas poucas vezes em que o amor se atreveu a fazer uma visita de última hora ao gélido coração daquele homem. Pois é, isso aconteceu justamente numa segunda-feira de agosto. Para você ver como essas coisas podem acontecer a qualquer tempo, já que a primavera ainda nem havia chegado. Agosto! Pois sim!

Lá estava o Anibal na fila da padaria, rosto sonolento por mais uma noite mal dormida. Isso como se aquilo não fosse uma rotina de anos. Pois lá estava o velho na tal fila, quando se deparou com uma simpática atendente. Solange, era esse o nome da mulher, com lá seus 60 anos, não se sabe o porquê, se sentiu atraída por aqueles cabelos grisalhos. Sentiu-se e pronto! Coisas do coração não se questiona, mas se aceita e ponto final.

O namorico, que começou com um sorriso, logo se transformou em noites de alcova, apesar da flagrante falta de prática, muito mais do gajo do que da interessada. Solange até brincava com o então namorado, dizendo que fazer amor era como andar de bicicleta, ou seja, uma vez aprendido direito, não se esquecia. Anibal sorria, enquanto tentava tomar fôlego para a próxima, que, certamente, não seria pelas próximas horas, quiçá no próximo dia ou na semana seguinte.

O homem colocava um filme para assistir com a namorada, que, a princípio, tudo aceitava. No entanto, de tantos filmes repetidos, acabou buscando outros ares. Sem qualquer eufemismo, Solange engatou um romance com um outro cliente, que, apesar de regular em idade com o Anibal, além de não ser muito afeito a passar as noites vendo filmes, parece que consegue manter o fôlego em dia.

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