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Sangue na eleição

Assassinato de petista por bolsonarista liga alerta vermelho

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Autor/Imagem:
Marina Amaral/ Diretora Executiva da Agência Pública - Foto de Arquivo

O assassinato político do guarda civil Marcelo Arruda, em Foz do Iguaçu, fez soar o alerta vermelho para todos que defendemos a democracia, a Constituição Brasileira, o direito à expressão e manifestação política dos cidadãos. Igual repúdio merece o aproveitamento eleitoral que o presidente candidato tentou fazer dos fatos que poderiam prejudicá-lo. E para isso, infelizmente, Bolsonaro contou com a ajuda dos erros cometidos na cobertura do caso pela imprensa, que provocaram muitas críticas nas redes sociais.

Primeiro, as manchetes falavam em “troca de tiros” entre “petista e bolsonarista”, ignorando o fato de que o agressor “bolsonarista”, um agente penal federal, invadiu a festa de Marcelo e atirou nele, enquanto a vítima “petista” tentava se defender. Depois que se soube que havia apenas uma vítima, já que a Polícia Civil disse de início que ambos haviam morrido – ah, as fontes oficiais – a motivação política do crime passou a ser minorada, como se fosse uma acusação do PT, apesar de as evidências apontarem ter sido essa a razão do assassinato.

Um exemplo é o Boletim de Ocorrência, lavrado no dia 10 de julho, e publicado nesta data pelo repórter Caio Junqueira, em seu twitter. Cito um trecho: “Todos relataram que estavam na festa de aniversário da vítima com tema do PT e que, em certo momento, uma pessoa que era desconhecida de todos no local chegou com armas em mãos, dizendo ‘aqui é Bolsonaro'”. Os vídeos feitos na noite do crime (09/07), mostrando as duas vezes em que o assassino visita o local da festa, amparam os testemunhos.

As razões para o enviesamento do noticiário, que difundiu a imagem de uma briga causada por um suposto extremismo petista e bolsonarista (embora o agressor seja do lado conhecido pela violência) foram dissecadas pela jornalista Fabiana de Moraes, que aliás, também nos orgulha por fazer parte do nosso Conselho Consultivo. Recomendo a leitura de sua coluna no Intercept desta semana, reveladora desde o título, “A imprensa que insiste na polarização é cúmplice na barbárie”.

Essa “polarização”, apoiada em falsa equivalência entre Bolsonaro e Lula como aponta Fabiana, é o cenário perfeito para o desenrolar da narrativa ideológica criada por Bolsonaro para seus eleitores: o Brasil “vive uma guerra” entre dois campos extremos, na qual se justifica qualquer coisa para “salvar o país”. Basta ver a declaração cínica de 2018 que o presidente repetiu agora: “Dispensamos qualquer tipo de apoio de quem pratica violência contra opositores. A esse tipo de gente, peço que por coerência mude de lado e apoie a esquerda, que acumula um histórico inegável de episódios violentos”.

Acontece que, como sabemos todos, um dos lados, com o agravante de ser o liderado pelo atual ocupante da Presidência da República, fala em “fuzilar a petralhada”, enaltece a tortura e os assassinatos da ditadura, ameaça ministros do STF. Com a caneta presidencial na mão, distribui armas entre a população, incentiva a violência policial, transforma programas sociais em caça-voto, ameaça melar as eleições, corrompe o Exército com afagos e exigências pessoais, protege milicianos, garimpeiros, e outros criminosos.

Não há como a imprensa continuar a compará-lo ao outro candidato, a menos que se admita nessa visão um antipetismo subjacente, que minaria qualquer aspiração de objetividade jornalística. Vamos torcer para que não seja o caso.

Na campanha de 2018, a Agência Pública monitorou a violência no país e chegou a uma conclusão objetiva: a grande maioria das agressões, pelo menos 50 das 70, foi feita por apoiadores de Bolsonaro – apenas 6 vítimas eram bolsonaristas. “Isso mostra que as declarações de Bolsonaro que incitam a violência estão ecoando país afora e se transformaram em agressões físicas e verbais nestas eleições”, esclareceu a reportagem.

Com o candidato da violência eleito não se poderia esperar evolução positiva de lá para cá, mas a imprensa insiste em amenizar o fato de que o Brasil é dirigido por um grupo de extrema direita, o que é novidade desde o fim da ditadura e perigoso para o país. E isso não tem nada a ver com o PT.

Sem dar os nomes aos bois e apontar claramente de que lado vem o perigo, preservando a integridade dos fatos, a imprensa perde a força crucial que detém para que as eleições e a democracia vençam as ameaças que a extrema direita traz para o país.

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