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Crises fabricadas

Bolsonarismo decide culpar STF e TSE por uma eventual derrota

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Autor/Imagem:
Mathuzalém Junior* - Foto de Arquivo

Na lista negra da Presidência da República desde a posse do capitão, em janeiro de 2019, o Supremo Tribunal Federal e o Tribunal Superior Eleitoral certamente serão apontados como os grandes responsáveis por uma eventual derrota de Jair Messias em outubro. O clima de ebulição entre Executivo e Judiciário começou ainda na campanha, quando o deputado federal Eduardo Bolsonaro, o filho Zero Três, disse que bastariam “um soldado e um cabo” para fechar a principal instância judiciária do país. A relação azedou de vez no auge do enfrentamento da crise sanitária, ocasião em que o Supremo decidiu que governadores e prefeitos tinham autonomia para implementar políticas públicas para controlar a doença.

O mandatário esperneou, chegando a insinuar que o STF havia excluído o governo federal da tomada de decisões para combater a pandemia de Covid-19. Na época, por meio de uma nota conjunta, a Corte se manifestou afirmando que “uma mentira contada mil vezes não vira verdade”. E realmente não virou. A corda continuou sendo esticada com ataques pessoais aos ministros Luiz Roberto Barroso e Alexandre de Moraes, atingindo níveis incontroláveis após o mito iniciar uma insistente cruzada contra o sistema eletrônico de votação. Os arroubos presidenciais chegaram ao cúmulo quando ele começou a “desenhar” a possibilidade de golpe caso não houvesse o voto impresso.

Em meados do ano passado, o presidente, eleito várias vezes com a urna eletrônica, assegurou para apoiadores que, se o Tribunal Superior Eleitoral “não fizesse eleições limpas não teríamos eleições”. Estava aberta a temporada de caça à democracia, cujo ápice ocorreria às vésperas e no 7 de Setembro de 2021. A prisão do ex-deputado Roberto Jefferson, a carraspana pública no cantor (?) sertanejo Sérgio Reis e a rápida reação do presidente e dos demais ministros do STF acalmaram os ânimos. Na verdade, abortaram o golpe maluquete que o mito e sua trupe aprontaram para o Dia da Independência. Seria o Dia da Diáspora bolsonarista, incluindo notícias crime e “dispersão” de representantes do tribunal.

Na linha do tempo da crise, de lá para cá pouca coisa mudou. A tensão entre Jair Messias e Alexandre de Moraes, futuro presidente do TSE, começou ainda em 2019, com a abertura do inquérito das fake news, e pode ter seu ápice durante a efervescência do período eleitoral. Entre a tênue linha que vai da ausência de tino político ao apego excessivo ao poder existe a possibilidade clara de o Brasil sumir na areia movediça da tirania. Por enquanto, assim como a fabricação de crises para desviar o foco dos verdadeiros e infindáveis problemas do país, há o imponderável, que hoje atende pelo nome de Joe Biden. Em outras palavras, os recados anti ameaças têm sido dados. O último chegou até nós por meio da nova embaixadora norte-americana no Brasil, Elizabeth Bagley.

Guardadas as devidas proporções relativas à soberania nacional, vale repetir que o Haiti não é aqui. No país em que só Deus tira o presidente do poder, tudo pode acontecer, inclusive Lula ganhar e, a exemplo do que fez Donald Trump, experimentarmos algumas bravatas mais perigosas, mas, no fim e ao cabo, fica o dito pelo não dito. Caso aconteça o pior para as hostes bolsonaristas, uma eventual derrota de Jair Messias será creditada ao STF e ao TSE, particularmente aos ministros Luiz Roberto Barroso, Alexandre de Moraes e Edson Fachin. O resumo da ópera é que podemos ter um novo governo a partir de janeiro de 2023, mas dificilmente o bolsonarismo impregnado na falácia dos falsos profetas sairá de cena. Fanáticos não perecem.

*Mathuzalém Júnior é jornalista profissional desde 1978

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