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Dor da perda

Bolsonaristas lamentam partida do mito no dia dedicado a morto

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Autor/Imagem:
Wenceslau Araújo - Foto José Cruz

Para os bolsonaristas mais arraigados, Luiz Inácio é odiado por metade dos brasileiros. Verdade verdadeira. Da mesma forma, Jair Messias Bolsonaro é apavorantemente temido por metade e mais um punhado de brasileiros. Empate técnico? Claro que não. Mesmo odiado, Lula da Silva ganhou e defenestrou Bolsonaro de uma poderosa função que ele achava absoluta e eterna. Passado o período mais tenso da pós-eleição, o que restou do futuro ex-presidente foram as ameaças, os xingamentos e a constante apologia do golpismo. Apesar das fake news, da disseminação da estupidez e do ódio, da distribuição desenfreada de armas e do pouco caso com os mais pobres, venceu a esperança, a paz, a serenidade e a solidariedade.

Por falar em supostos mais pobres, ao contribuir diretamente com a eleição de Lula, os irmãos do Nordeste acabaram por evitar que a pobre elite se enforcasse com a própria corda, que seria a reeleição de Bolsonaro. Nada de extraordinário nessa constatação, principalmente considerando que os denominados abastados atropelaram de tal maneira o Brasil que transformaram uma das maiores referências do país em símbolo do banditismo. Refiro-me à Bandeira Nacional que, depois de servir de enfeites para capôs de automóveis e de adornos para varandas, passou a envelopar os moribundos baderneiros e milicianos rodoviários que fecham rodovias desde a confirmação da derrota do mito.

Desde sua inclusão na política nacional, o bolsonarismo nada mais é do que sinônimo de obstinação ou zelo religioso capaz de levar a extremos de intolerância. É o exemplo cristalino do fanatismo, que pode ser entendido como facciosismo partidário ou adesão cega a um sistema ou doutrina. São sentimentos ruins, que corroem a alma, o coração e a mente. Entretanto, nada pior do que a adoração virar dedicação excessiva a alguém ou algo. É a tal da paixão. O melhor combate à beatice exagerada é o conhecimento. Portanto, antes de idolatrar, procure conhecer a história do ídolo.

Para isso, não há necessidade de ir muito longe. Basta saber o que e como faz, o que diz e o que fez. Se é que fez. No caso do atual ocupante do Palácio do Planalto, a idolatria é um embuste, da mesma forma que o idolatrado não passa de um engodo forjado nas redes sociais alimentadas por um familiar inteligente. Tanto isso é verdade que Bolsonaro jamais se preocupou com qualquer ser humano que não fosse simpático às suas ideias extremistas. Nessa terça-feira (1), depois de quase 48 horas da vitória de Lula, um dos últimos gestos do já quase ex-presidente foi agradecer seus cerca de 58 milhões de votos. Entretanto, não teve a hombridade de lembrar dos 60,3 milhões de eleitores que garantiram o terceiro mandato para Lula da Silva. Estes ele abomina. Sempre abominou.

Sobre a última tentativa de golpe, vale ressaltar que, com muito mais poderio bélico e econômico, Donald Trump, também inconformado com a derrota, tentou esticar a corda da estupidez e não conseguiu êxito. Deixou órfão um bando de loucos. Também vale lembrar que, em 1964, início do autoritarismo que durou 25 anos, o presidente dos Estados Unidos era John Kennedy, um dos apoiadores e financiadores do golpe. Hoje, democrata convicto, o mandatário norte-americano é Joe Biden, ferrenho antagonista de Jair Bolsonaro e antigo admirador de Luiz Inácio. Digo isso só para lembrar o que sempre disse: o Brasil não é o Haiti, tampouco a Nicarágua ou a Venezuela.

Lembrando também um dos mais emblemáticos episódios do início do governo de Jair Messias, quando o deputado federal Eduardo Bolsonaro disse que bastava um cabo e um soldado para fechar o Supremo Tribunal, registre-se que um único e corajoso sargentão venceu a guerra de nervos que a turba bolsonarista, incluindo a direção da Polícia Rodoviária Federal, tentou criar para o dia da eleição. Alexandre de Moraes, ministro da Suprema Corte e comandante da Justiça Eleitoral, mostrou que grita mais quem grita por último. Neste dia dedicado aos mortos, lembro principalmente o perecimento de um mito. Também lamento as más lembranças da excelência que voltou ao pó, e louvo a volta daquele que nunca se foi. Como cristão, não posso deixar de consolar todos os que estão sofrendo a dor da perda. Uma pena que chorem fechando rodovias, fazendo sofrer quem nunca os incomodou. É um erro vulgar confundir o desejar com o querer. Grandes vitórias exigem grande dedicação. Sejam humildes, lutem, esperem e tentem voltar em 2026.

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